Brasil recua para 16ª posição entre países mais otimistas, de acordo com o mais recente estudo Internacional Business Report (IBR) da Grant Thornton, que ouviu cerca de 5 mil empresários em 29 países, incluindo o Brasil.
Marcus Frediani
Depois de conquistar um expressivo 6º lugar no segundo semestre de 2019 no ranking global da Grant Thornton – uma das maiores empresas de auditoria, tributos, consultoria, transações e BPS, com presença em mais de 140 países –, o Brasil caiu dez posições, indo para o 16° lugar nessa pesquisa que mede o grau de confiança dos empresários quanto aos próximos 12 meses da economia global. O estudo, realizado agora em meio à crise sanitária e econômica que o mundo atravessa por conta da pandemia de COVID-19, ouviu e mensurou as impressões de cerca de 5 mil empresários em 29 países, incluindo o Brasil.
O fato é que agora, segundo o Internacional Business Report (IBR) da Grant Thornton, apenas 40% dos empresários brasileiros estão otimistas com o futuro da economia brasileira. Na edição anterior do ranking global da Grant Thornton, 69% dos empresários brasileiros se declaravam otimistas. Paralelamente, a média mundial no quesito também despencou, registrando uma queda de 15 pontos percentuais, de 59% na edição anterior para 43%.
Dessa forma, o resultado do Brasil contrasta com as expectativas de alguns países, digamos, no mínimo “interessantes”, nos quais o otimismo em relação ao futuro é bem maior, tais como os Emirados Árabes, líderes no ranking (com 69%), seguido na vice-liderança pelo Vietnã (65%) e China (65%) e, subsequentes, da Nigéria (64%) e Índia (63%). E o Brasil ficou atrás ainda de países como Argentina (41%), México (41%) e empatado com Turquia, também com 40%.
Para entender melhor o que está acontecendo, a revista Siderurgia Brasil conversou com Daniel Maranhão, CEO da Grant Thornton Brasil. Confira!
Siderurgia Brasil: Daniel, como se explica essa queda alarmante nos índices de otimismo do empresariado brasileiro e das economias mundiais? Podemos colocar isso na conta da COVID-19?
Daniel Maranhão: Sem dúvida, expressiva parte dessa queda pode ser justificada pelo novo coronavírus. Contudo, não foi só por isso: nessa conta podemos colocar também a piora em alguns cenários políticos. As agências de risco, como a Fich, esperam uma queda de 4,6% no PIB mundial. Mas, para o Brasil, a queda esperada pode ser maior do que 7%. Na edição anterior do estudo do Internacional Business Report (IBR) da Grant Thornton, o Brasil tinha acabado de aprovar a reforma da Previdência, e já falava em aprovação das reformas Tributária e Administrativa. Agora, passados seis meses, aumentamos muito o nosso déficit fiscal com os gastos necessários para ajudar as famílias e as empresas durante a pandemia. Contudo, não andamos com nenhuma das duas importantes reformas. O período também foi marcado por um cenário turbulento entre o governo e o Supremo Tribunal Federal (STF) e pela aproximação das eleições municipais. Já no âmbito internacional, a reeleição do Trump, que era dada como certa nos Estados Unidos antes da pandemia, já não é uma certeza. Isso gerou desequilíbrio e, como se sabe, nem o mercado de capitais e nem os empresários gostam de trabalhar com incertezas. Porém, a partir do momento em que esses cenários começarem a ficar mais claros e as reformas e medidas econômicas – como algumas privatizações no Brasil – andarem em ritmo mais acelerado, certamente o otimismo do empresariado vai voltar.
OK! Então, independentemente da pandemia, podemos dizer pelo menos que no final de 2019, estávamos no caminho certo?
Sim, estávamos. Naquela época, o otimismo estava, em boa parte, relacionado com o momento. Tínhamos acabado de aprovar uma reforma importante, sem maiores danos, sem grandes manifestações sindicais e, com grande apoio da população. Além disso, víamos de pouco tempo de uma eleição que buscava uma mudança drástica na direção da economia, agora rumo ao liberalismo econômico, que de forma geral, é muito bem aceita pelos empresários. Se a gente já tivesse andando com uma das duas reformas que estão por vir, em especial a Tributária, com algumas privatizações importantes, como Correios e outra grande estatal, e com algumas medidas microeconômicas, como pontos dentro do marco regulatório de infraestrutura – a mudança na legislação sobre debentures de infraestrutura é um exemplo –, nós estaríamos muito mais atrativos aos investimentos internacionais do que estamos hoje.
Ou seja, por conta de problemas como esses, o Brasil já não trilha mais um caminho tão virtuoso.
Creio que, no final do ano passado, estávamos no caminho correto, apesar das turbulências políticas permanecerem. O problema é que hoje, com a crise mundial de COVID-19 afetando diretamente dezenas de países, o cenário é diferente para todos, e não só para o Brasil, porque antes havia menos concorrência por investimentos internacionais. Hoje, a concorrência é muito maior, e o Brasil tem uma legislação atrasada para competir. Precisamos rapidamente andar com a melhora de nossa legislação Tributária, e Administrativa, entre outras, e correr com as aprovações dos marcos regulatórios necessários, como fizemos com o Marco do Saneamento. Ou seja, precisamos criar condições para o investidor internacional rapidamente trazer divisas ao Brasil. Em suma, agora precisamos de mais velocidade nas medidas.
Mas tendo em mãos informações como aquelas que vocês compartilharam nesse último IBR da Grant Thornton, no qual caímos dez posições no grau de confiança dos empresários, não vai ficar ainda mais difícil o Brasil atrair capital estrangeiro?
O ranking é mais um ponto em que os investidores internacionais ficam atentos. Hoje, o investidor internacional avalia o Brasil através de diversos primas. Se por um lado, evidentemente, andamos bastante com a aprovação da reforma da Previdência, entre outras coisas, por outro o Brasil piorou muito sua imagem internacional em assuntos sensíveis, como o cuidado com o meio ambiente, o combate à COVID-19, os embates entre os poderes públicos, como o executivo e a mais alta Corte do Judiciário. Com isso, volta a preocupação com a capacidade do governo em aprovar as reformas fundamentais para o Brasil, como a Tributária e a Administrativa. E tudo isso é avaliado pelo investidor internacional. Hoje, para esse investidor, o problema do Brasil é que ele não consegue ter uma perspectiva e confiança de como o Brasil vai caminhar daqui para frente. E, como eu disse aí atrás, o investidor, seja na economia real, seja no mercado de capitais, detesta as incertezas. Mas, não podemos esquecer que ainda continuamos com um público consumidor de cerca de 210 milhões de pessoas. E isso é importante para as empresas.
E, pelo que dá para entender, o confuso cenário político brasileiro atual está “contaminando” os índices de otimismo e confiança da economia brasileira não só aos olhos dos investidores internacionais, como também àquele empresariado nacional.
Bastante. Além dos constantes embates entre os Poderes – às vezes entre o Executivo e o Judiciário, outras entre o Executivo e Legislativo –, é nítido que o governo vem perdendo a luta da comunicação. Ou seja, o governo não se comunica bem.
E há solução para esse imbróglio, ao menos no médio prazo?
Diversas medidas no cenário econômico estão sendo tomadas para preparar o Brasil para um longo período de crescimento, mas o governo coloca muito esforço e perde tempo também com debates ideológicos e, com isso, não foca na comunicação positiva. Para aqueles menos atentos a tudo que acontece, podem chegar no exterior apenas as notícias negativas e, tudo de bom que está sendo feito no âmbito econômico fica minimizado. As pautas irrelevantes devem ser deixadas de lado, e o Poder Executivo precisa se comunicar melhor.
Voltando à pesquisa, a queda no otimismo registrada no levantamento de vocês destoa de algumas pesquisas, como a recente Prévia Extraordinária das Sondagens realizadas pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV), sinalizando uma recuperação nos índices de confiança, tanto empresarial quanto do consumidor. Qual a razão dessa dissonância?
O ranking do IBR da Grant Thornton é feito por meio de uma pesquisa com empresários ao redor do mundo. Desses, 250 são do Brasil. É um recorte e, num período entre seis e seis meses. Os dados levantados agora durante a pandemia são comparados com os dados levantados em dezembro de 2019, e divulgados em janeiro de 2020, quando vínhamos no Brasil de uma aprovação da reforma da Previdência e perspectivas de aceleração do crescimento e da atividade econômica. Já os dados de confiança de outros institutos como os da Fundação Getúlio Vagas são feitos mês a mês, e em outra amostra de recorte. Ou seja, o índice de confiança da FGV de julho melhorou em relação a junho, enquanto em nosso ranking de otimismo o Brasil piorou, mas em comparação com janeiro. São amostragens diferentes, em que a comparação não cabe, pois são realizadas a partir de bases e períodos distintos.
Uma boa notícia nessa história toda é que, apesar da queda no otimismo, nesse último ranking da Grant Thornton ainda estamos na frente de países importantes no cenário mundial, tais como França, Reino Unido, Alemanha, Coreia do Sul e Japão. De que forma isso pode ser “bom” para o nosso lado? Ou será que o empresariado brasileiro está deixando de ver algo importante no cenário internacional que essas outras nações estão vendo?
A resposta tem correlação direta com nossa cultura. O brasileiro geralmente é menos pragmático e tende a ser, por essência, um povo otimista. Essa característica é bem diferente do que se observa no japonês, no inglês e no alemão, que, em geral, são mais pragmáticos ao olhar os índices e números de sua economia. O Brasil possui um mercado interno enorme, o setor de Agronegócio tem crescido significativamente e impulsionado as exportações, e há boas oportunidades no setor de Saneamento e Infraestrutura.
Um dado que parece positivo nesse último IBR diz respeito à “Empregabilidade”, que revela que 46% dos entrevistados acreditam no aumento do emprego, o que coloca o Brasil em 6º lugar no ranking, acima da média global, que é de apenas 28%. Contudo, num país onde já se fala em mais de 36,6 milhões de desempregados isso não é contraditório?
Não. Devemos lembrar que o ranking prevê os próximos 12 meses. A nossa leitura é que as empresas respondentes do questionário do IBR já adaptaram seus quadros de colaboradores à queda da demanda advinda por conta da pandemia. Agora, a previsão de demissão é menor, e os empresários podem voltar a contratar.
Para finalizar, como você avalia o cenário do otimismo no período de pós-pandemia para a economia brasileira? Ele será propicio, por exemplo, à dinâmica de fusões e aquisições?
O mercado de fusões e aquisições continuou aquecido durante a crise, e deve aumentar após crise. Contudo, devemos olhar alguns detalhes. Por um lado, a pandemia certamente reduziu bastante o potencial de caixa de algumas empresas, exceto alguns setores específicos que mantiveram o mesmo ritmo ou cresceram em suas operações. Entretanto, algumas empresas que antes não viam no seu horizonte serem vendidas ou participarem de uma fusão podem ter mudado sua estratégia devido aos efeitos negativos em suas operações e, consequentemente, no seu fluxo de caixa e ou nível de endividamento. É necessário esperar um pouco mais para ter mais transparência em como cada empresa vai sair de 2020. Adicionalmente, teremos um aumento no processo de pedidos de recuperação judicial, bem como um número significativo de empresas fazendo IPO, uma vez que o mercado de renda fixa não está mais atrativo. Como eu disse, é preciso esperar para ver.