Gerdau lança nova empresa para atuar no mercado de grafeno nas Américas, com o objetivo de gerar ainda mais valor aos seus clientes e entrar em setores estratégicos.

Marcus Frediani

Acabou o mistério. No dia 15 de abril, a Gerdau – que, em janeiro deste ano, completou 120 anos de evolução constante – rompeu o ciclo de silêncio que cercava as especulações sobre a entrada da empresa em um novo ramo de atuação, e anunciou oficialmente, o lançamento da Gerdau Graphene, uma nova unidade de negócios focada no desenvolvimento e comercialização de produtos com a aplicação de grafeno. A companhia, que terá operação independente das divisões de negócio de aço, já nasce com objetivo de ser uma referência no fornecimento do material em escala não só para o Brasil, mas também com aspirações globais.

Segundo analistas de mercado, a nova estratégia foi desenhada pelo grupo após o processo de desinvestimento de ativos em diversos países, em função da baixa rentabilidade de vários negócios em seu portfólio de aços, que foram vendidos entre 2014 e 2018, o que fez com que ele saísse da Europa e da Índia, para se concentrar nas Américas. Com a saída da família Gerdau da gestão executiva, em 2019 foi definido um plano de atuação de longo prazo, cuja meta é obter, até 2030, uma parcela significativa da receita a partir da operação com áreas adjacentes do aço, ou novas. E esse foi, exatamente, o caso da operação com grafeno, que começou a ser formatada pela empresa a partir da experiência em sua divisão de Aços Especiais.

Assim, a Gerdau Graphene foi integrada ao portfólio da Gerdau Next, divisão de novos negócios da Gerdau, lançada no segundo semestre de 2020, e nasce posicionada como uma relevante desenvolvedora de grafeno nas Américas. O material apresenta benefícios de propriedades mecânicas, como a redução de peso e de atrito, maior eficiência em lubrificação, maior condutividade térmica e elétrica, entre outras. Com escritório principal em São Paulo, e uma filial nos Estados Unidos, a empresa prevê oferecer mais tecnologia para os setores da construção civil, lubrificantes industriais e automotivos, borracha, termoplásticos, tintas, baterias e sensores, no Brasil e em países da América do Norte.

A unidade da capital paulista, instalada no prédio-sede da Gerdau, funcionará como central de distribuição e de desenvolvimento de tecnologia de produtos, contando com o suporte da equipe de P&D de aplicações lotada na Gerdau Aços Especiais de Charqueadas, no Rio Grande do Sul, e do time do Centro de Inovação de Engenharia de Grafeno, montado especialmente pela empresa no campus da Universidade de Manchester, no Reino Unido.

OPEN INNOVATION
De acordo com Alexandre de Toledo Corrêa, diretor geral da Gerdau Graphene, o desenho da nova unidade de negócios de grafeno do grupo se deu essencialmente no sentido de diversificar a atuação da Gerdau para o aproveitamento de novas oportunidades de inovação no mercado, tendo como base a vasta expertise do grupo no setor de aço. Dessa forma, ela entra no radar da indústria de forma singular por sua aposta em tornar a produção do material em larga escala comercialmente viável, e perfeitamente alinhada com a demanda das empresas.

“Estamos chegando com o diferencial de sermos parte de um grupo sólido e de forte credibilidade internacional, mas com a filosofia embarcada de Open Innovation, em colaboração com múltiplos ecossistemas. Nossa proposta de valor, diferenciada, é de fornecer ao mercado aditivos, boosters e soluções com o grafeno que sejam plug-and-play para os processos industriais de nossos clientes. Ou seja, iremos comercializar tanto o produto quanto o serviço e know-how em grafeno e, para isso, contamos com alianças estratégicas com parceiros globais e nacionais”, explica o executivo, destacando que a própria Gerdau e suas usinas de aço, além de serem seus primeiros clientes da nova unidade de grafeno, funcionarão como uma espécie de “laboratório de testes” para a criação de novos produtos e soluções com velocidade e intimidade de aplicação.

Além disso, para iniciar uma unidade de negócio com um posicionamento estratégico e capilaridade, a Gerdau Graphene já nasce com parcerias estratégicas com grandes desenvolvedores de grafeno. E, mais especificamente no mercado brasileiro, tem parcerias estratégicas no setor automotivo com a Baterias Moura e a SKF do Brasil – esta, aliás, a primeira empresa a apostar na tecnologia do grafeno desde o início do projeto da nova unidade de negócios, há quatro anos –, para desenvolver aplicações em armazenagem de energia, artefatos de borracha, compósitos e tintas.

Corrêa afirma ainda que a nova empresa irá propor soluções e aplicações para os atuais clientes e fornecedores da Gerdau, gerando sinergia entre as operações futuras de grafeno e os canais já existentes de vendas, compras e aplicação técnica. “Ao nos apoiarmos em toda a estrutura Gerdau, garantiremos eficiência, excelência e velocidade, nessa etapa inicial, nas entregas com as parcerias que estamos firmando”, comenta.

CARACTERÍSTICAS ÚNICAS
O grafeno é um nano material composto apenas por carbono, em que os átomos se ligam formando estruturas hexagonais. Em outras palavras, refere-se a uma das formas cristalinas do carbono, assim como o diamante e o grafite, este último com reservas abundantes no Brasil. Por apresentar características únicas, tornou-se o maior condutor elétrico, um dos melhores condutores térmicos e um dos materiais mais resistentes e duros da atualidade. Além disso, suas propriedades ópticas permitem a passagem de quase 98% da luz incidente, além de ser extremamente flexível e impermeável, o que permite ao material inúmeras aplicações potenciais.

Para entender a cadeia de valor do grafeno, pode-se fazer um paralelo com a produção do aço. Da mesma forma como o ferro, matéria-prima deste último, depois da extração, o grafite passa por um processo de beneficiamento, na maioria dos casos, por meio de uma esfoliação química para ser obtido. Em síntese, ele é um grafite com poucas camadas atômicas, esfoliado até ficar bidimensional. E como a força que une as camadas é uma força fraca, é preciso mantê-lo disperso para que ele não se junte e vire novamente grafite. “O próximo passo é aplica-lo em um aditivo, para entregá-lo pronto para os clientes, tanto em estado sólido quanto disperso em um líquido, como é o caso, por exemplo, das tintas anticorrosivas para aplicação sobre peças de aço, para conferir-lhes maior resistência à oxidação e a abrasão, sem a necessidade de fazer grandes ajustes para utilizá-las”, detalha Alexandre Corrêa.

MERCADO DE US$ 2,7 BILHÕES
A Gerdau pesquisa grafeno há quatro anos. Em 2019, a Gerdau firmou parceria com o já citado Centro de Inovação de Engenharia de Grafeno da Universidade de Manchester, para desenvolver pesquisas exclusivas. Na época, a companhia entrou para o seleto grupo global de empresas com cadeiras exclusivas na instituição, que é uma das referências acadêmicas no tema.

E tal experiência foi amplificada no Brasil, que, segundo Corrêa, vive um bom momento da pesquisa do grafeno. “Hoje, temos vários centros importantes trabalhando com a pesquisa desse material, como a Universidade de Caxias do Sul, a Universidade Federal de São Carlos e a Universidade Mackenzie, aqui em São Paulo, que têm desenvolvidos estudos avançados sobre ele, e com os quais estamos conectados. Complementarmente, também temos planos para construir dois centros de pesquisa de grafeno locais aqui no país, para trabalharmos mais próximos a esses pesquisadores, e levar essa tecnologia nacional para fora do Brasil, como, aliás, já fazemos com a Gerdau, na parte de aços”, revela o diretor geral da Gerdau Graphene. Em termos de futuro, Corrêa diz que tudo vai depender, naturalmente, da resposta do mercado para os produtos da nova Gerdau Graphene. A avaliação desta sua primeira fase da operação tem um período estimado de dois a três anos para acontecer. “Nela, deveremos pensar muito mais em valores do que, propriamente, em volume, porque o cômputo deste vai depender dos tipos de aplicação do grafeno Gerdau nos mercados do Brasil e dos outros da América Latina, além do Canadá, Estados Unidos e México. Juntos, estimamos que eles têm um potencial de negócios da ordem de US$ 2,7 bilhões. Então, o que queremos nesta primeira fase é abrir mercado, criar demanda, mostrar as vantagens e tornar nossa tecnologia e produtos conhecidos. A segunda, deverá envolver a de decisão da produção nacional em nossas unidades. E, a terceira, será a de construirmos uma fábrica para fazer isso”, finaliza Alexandre de Toledo Corrêa.