Novo presidente do Conselho da ABIMAQ projeta cenário otimista para o setor de máquinas e equipamentos no Brasil.

Marcus Frediani

De acordo com o balanço da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (ABIMAQ), as vendas do setor caíram 5,6% em junho em relação a maio, deixando o setor no vermelho no 1º Semestre deste ano, com queda acumulada de 3,7% na comparação com o mesmo período do ano passado.

Mesmo assim, em valores, no acumulado do 1SM22, a receita líquida total atingiu expressivos R$ 150,6 bilhões, com a receita interna somando R$ 121,2 bilhões, e o consumo aparente batendo R$ 187,5 bilhões. Destaque também foi a performance positiva das exportações, que registraram um crescimento de 29,2% ante ao semestre anterior: os embarques somaram US$ 5,6 bilhões no período. No sentido inverso, as importações somaram US$ 11,6 bilhões, crescimento de 10,7%. O saldo do setor ficou negativo em US$ 6 bilhões.

O desempenho do setor continua heterogêneo, com crescimento dos segmentos ligados ao agronegócio e construção civil; estabilidade nos setores fornecedores para a indústria de transformação e queda nos fornecedores de componentes, máquinas para bens de consumo e para infraestrutura. Com a continuidade dos problemas na economia brasileira, e ainda sem uma política industrial bem delineada para o país, ele parece moldar-se ao que está ao alcance, só que nem sempre isso é possível.

Contudo, embora tal cenário não seja obviamente o ideal, fato inquestionável é a força da indústria de máquinas e equipamentos, que de 2018 a 2021 cresceu 37%, ante avanço de apenas 3,6% do PIB agregado, ou seja, dez vezes mais do que o Produto Interno Bruto Brasileiro. E é notadamente essa força, entre outros aspectos bastante relevantes, que o novo presidente do Conselho da ABIMAQ, Gino Paulucci Junior, faz questão de destacar nesta entrevista exclusiva concedida à revista Siderurgia Brasil. Confira!

Siderurgia Brasil: Paulucci, apesar do resultado negativo da venda de máquinas no 1º Semestre de 2022 de 3,7% a menos em relação ao 1SM do ano passado divulgado no final de julho pela ABIMAQ – relativamente minimizado, entretanto, pelo crescimento das exportações –, o setor mantém a previsão de crescimento na faixa de 10% a 15% para 2022. O que anima essa perspectiva? A continuidade do aumento das exportações?
Gino Paulucci Junior:
As expectativas da ABIMAQ para o desempenho do faturamento líquido da indústria de máquinas e equipamentos em 2022 é de crescimento de 3,4%. Para as exportações a expectativa é de crescimento de 15% em dólares, mas com impacto na receita em reais de máquinas negativo em razão da variação cambial e de preços no período.

A que elementos vocês atribuem esse desempenho otimista projetado da receita para o final de 2022?
Acreditamos na conjunção favorável de alguns fatores importantes. O primeiro deles, é o tradicional comportamento sazonal do setor no 2º Semestre do ano, que, em 2022 cujo crescimento é hoje projetado pela ABIMAQ em torno de 10%. Outro, bastante significativo, é o elevado nível de emprego no setor: atualmente, ele possui um quadro de pessoal 8% superior ao do ano anterior. Além disso, temos a elevada carteira de pedidos na indústria de máquinas e equipamentos. Mesmo tendo recuado em relação ao do ano de 2021, ela continua superior àquela do período pré-crise da pandemia da COVID-19. Complementarmente, como vem sendo observado, temos a normalização do setor de serviços, que é o maior setor da economia, e tende a manter a geração de emprego, renda e consumo no 2º semestre, bem como o elevado nível de utilização da capacidade instalada na indústria de transformação, que hoje é de 82%, adicionada à tendência de retomada da política de investimentos. Por outro lado, entretanto, vemos com preocupação os impactos da política de aperto monetário, que deverá impactar negativamente os setores mais sensíveis a crédito, fato que deverá merecer nossa especial atenção.

Falando especificamente da empregabilidade, estatísticas recentemente divulgadas pela ABIMAQ dão conta de que o indicador de emprego do 1TS22 também ficou positivo, registrando crescimento de 8,4% no 1SM21, e alta de 12,1% no total de funcionários do setor no acumulado de 12 meses. Quais as perspectivas dessa dinâmica para o final deste ano?
As perspectivas são boas. Os índices de confiança da indústria de máquinas e equipamentos divulgados há alguns dias pela FGV, indicam a continuidade das contratações, ao menos ao longo deste 3º Trimestre, período de maior atividade no setor. Prevemos, no entanto, desaceleração no último trimestre do ano, quando, ainda assim, o nível de emprego do setor poderá chegar a 390 mil pessoas, registrando um crescimento de 2% em relação a 2021.

Embora os segmentos de máquinas agrícolas e daquelas destinadas à construção civil estejam performando resultados positivos, isso parece não estar acontecendo com alguns outros atendidos pela entidade, como é o caso do automotivo, notadamente em função do aumento dos preços das matérias-primas – entre elas, o aço – e a continuidade do problema com o fornecimento de microcomponentes eletrônicos. Como você avalia essa questão?
De fato, os investimentos em máquinas e equipamentos neste ano de 2022 ocorrem de forma heterogênea. Setores relacionados ao agronegócio, à construção civil, e à geração de energia se destacaram entre os com maior crescimento na aquisição de máquinas e equipamentos, ocorreram investimentos ainda nas áreas de celulose, saneamento básico, plásticos entre outras. Por outro lado, na indústria de transformação, ocorreu queda em diversas atividades, entre elas a citada indústria automotiva, que no início do ano sofreu a falta de insumos necessários ao processo produtivo e exigiu a paralisação de algumas empresas do setor que têm peso importante na economia. E outros setores mais sensíveis à renda das famílias – como aqueles dos fabricantes de cosméticos, vestuários e calçados – também registraram quedas nos investimentos.

E com quais perspectivas vocês trabalham para cada um dos setores atendidos pelos fabricantes de máquinas no 2º Semestre de 2022?
A expectativa é de que a normalização no setor de serviços e também na cadeia de suprimentos de insumos possa aquecer a indústria de transformação, e anular a queda observada nos investimentos em máquinas e equipamentos no início deste ano. A dúvida, entretanto, está relacionada aos efeitos da política monetária sobre o consumo de bens mais sensíveis ao crédito. Por sua vez, nos setores relacionados ao agronegócio, o cenário já está dado: o setor tem carteira para atuar fortemente durante este ano, assim como o setor de máquinas para construção civil.

Apesar das previsões positivas de queda da inflação e do crescimento do PIB em 2022, as atuais projeções do Banco Central apontam uma evolução mais modesta dos dois índices em 2023 e 2024. Como isso impacta a evolução do setor de máquinas e equipamentos?
Todo ciclo de aperto monetário é danoso à economia, porque é um exercício que tem como objetivo controlar a inflação reduzindo a atividade econômica. Neste último ciclo, o quadro foi significativamente pior, porque tratava-se de uma inflação causada não pelo aumento da demanda, como nas crises tradicionais, mas, sim, pela desestruturação das cadeias de abastecimento, restringindo as ações do Banco Central aos efeitos secundários da inflação relacionados à ancoragem das expectativas. Assim, o Copom atuou exercendo aperto intenso e rápido, e seus impactos no setor produtivo serão sentidos ao longo dos próximos meses. Mas, concomitantemente, o governo exerceu política de redução da tributação de combustíveis, energia e outros bens e no mercado internacional, em razão da desaceleração da atividade em diversas economias, com a redução dos preços das commodities. E o resultado de tudo isso foi observado nos últimos dias, a inflação vem recuando e deverá chegar a pouco menos de 7% ainda este ano. Ato contínuo, a paridade cambial também tem se mostrado estável nas últimas semanas, o que, em conjunto com a moderação observada nos preços, deve ter ajudado a conter novas pressões de custos nas cadeias produtivas. Assim, acreditamos que esse quadro poderá abrir espaço para afrouxamentos monetários em 2023. Por outro lado, no caso de um cenário adverso que exija a manutenção dos juros em patamares elevados por muito tempo, certamente haverá consequências danosas para o nível de atividade, não só para o setor de máquinas e equipamentos, como também para toda a economia nacional. Por isso, a importância de outros mecanismos como reformas para reestruturar a parte fiscal do estado, focados na continuidade da agenda de reformas estruturantes, a fim de conduzir o Brasil ao crescimento sustentado.

Em meados do ano passado, a ABIMAQ foi bastante enfática em relatar a existência de um cenário de desabastecimento de aço no Brasil, o que fez a entidade dar início a uma série de estudos e reuniões com fabricantes de máquinas para concorrência na importação da liga, bem como com representantes de uma siderúrgica internacional e com uma agência de trading de importação para viabilizá-la. Na ocasião, o fato foi veementemente refutado pela indústria nacional e pelas entidades do setor siderúrgico e, hoje, parece que a situação encontra-se positivamente equacionada. Isso é verdade? Por outro lado, as tratativas para aquisição de aço importado tiveram seguimento, e, eventualmente continuam em andamento? Por quê? E, em caso positivo, qual o estágio atual dessas negociações?
De fato, observamos uma indisponibilidade física do aço para entrega para a indústria no momento e na retomada após as paralisações do início da pandemia no ano de 2020. E foi nesse período que uma série de ações da ABIMAQ foram implementadas para aumentar as oportunidades de abastecimento do setor. De 2020 a 2021 também observamos um acelerado aumento de preços e um descolamento dos padrões dos preços internacionais. Em decorrência disso, houve um aumento das importações especialmente no ano de 2021. Foram essas ações nos últimos dois anos que levaram a uma integração maior do setor como alternativas de aço internacional. E esse reposicionamento estratégico de alternativas de fornecimento permitiu um maior entendimento dos preços mundiais do aços pelo setor, que ainda se observa em 2022 no que diz respeito às importações. Então podemos dizer que algumas empresas que não eram afeitas ao comércio internacional de importação de aço, agora o fazem rotineiramente.

Em seu pronunciamento de posse à Presidência do Conselho de Administração da ABIMAQ, você destacou a necessidade de os bancos públicos se voltarem de maneira mais consistente à oferta de linhas de financiamento em melhores condições para as pequenas e médias empresas, uma vez que o acesso ao crédito é evidentemente mais fácil para as grandes. Por que você fez questão de mencionar isso na ocasião? E qual é, atualmente, a importância das PMEs em termos de participação/share, e do desenvolvimento delas para o setor nacional de máquinas e equipamentos?
A indústria de máquinas e equipamentos é um segmento da indústria de transformação bastante heterogêneo, que agrega empresas de todos os portes que atendem às mais diversas atividades econômicas, entre elas, a indústria siderúrgica, como também a de fabricantes de bens de consumo duráveis, não duráveis, produtos agrícolas, construção civil e infraestrutura. Segundo a Pesquisa Industrial Anual do IBGE, a indústria de máquinas e equipamentos é representada por mais de 8.000 empresas, na sua maior parte (cerca de 60%), de pequeno ou médio porte, com grande importância na geração de empregos, renda e tributos no país.

A alta carga tributária que incide na operação de todos os setores produtivos da economia brasileira – incluindo o de máquinas e equipamentos – continua sendo um sério problema para o desenvolvimento dela. Como você analisa as recentes movimentações do atual governo no sentido de melhorar esse quadro?
Sim, a elevada carga tributária é um sério problema no país, porque torna principalmente os bens industrializados mais caros. Por conta disso, aplaudimos as decisões recentes de redução de alíquotas de impostos. Mas tão importante quanto a redução da carga tributária é a reforma do atual sistema tributário, hoje um dos principais entraves à competitividade da indústria nacional em razão de diversos fatores, tais como a complexidade do sistema, que resulta em altos custos de conformidade e alta litigiosidade, e o formato de tributação na origem, que abre espaço para Guerra Fiscal entre estados, o que acaba distorcendo as decisões de investimentos. Além disso, ela onera exportações e investimentos por conta dos resíduos que ficam presentes em todos os elos da cadeia produtiva, e causam problemas em função da cumulatividade. E como eu já disse, todos esses fatores levam à perda de competitividade da indústria nacional, à redução da taxa de investimento, de produtividade, de exportações e consequentemente do crescimento econômico.

E quais são os pleitos da ABIMAQ nesse sentido, e como eles vêm sendo encaminhados? Há perspectiva de êxito?
Há anos temos trabalhado em favor de uma reforma tributária focada na criação do imposto sobre valor agregado, que é um modelo de tributação adotado por diversos países do mundo, e tem o potencial de modernizar e simplificar o atual sistema tributário brasileiro, com cobrança nas diversas etapas do processo de produção e comercialização e, em todas, garantindo o direito ao crédito correspondente ao imposto pago na etapa anterior. Nesse modelo de tributação, as exportações e os investimentos serão totalmente desonerados e as importações tributadas de forma equivalente à produção nacional, garantindo ganhos importantes de competitividade ao produto nacional. O debate em torno de uma reforma aos moldes da nossa demanda evoluiu bastante durante este ano. Assim, temos a expectativa de que este seja um dos temas a serem encaminhados durante os primeiros dias de gestão do próximo mandato do governo. E vamos lutar para que isto ocorra.