O que falta para efetivamente ingressarmos na era dos carros elétricos e desenvolvermos um mercado sólido?

Henrique Patria

Segundo os dados divulgados na última reunião da Anfavea relativa ao mês de agosto/23 foram emplacados no Brasil, 9,4 mil veículos leves elétricos ou híbridos e no ano de 2023, já chegamos em agosto a 49,1 mil o mesmo número que apuramos no ano passado inteiro. Portanto, nos meses do ano que faltam é possível dobrarmos a marca do ano passado. Entretanto estes números ainda são pequenos em relação aos 207,7 mil veículos emplacados em agosto de combustão tradicionais. Pouco mais do que 4%.

Atualmente grande parte dos carros elétricos ou híbridos que circulam por aqui são de origem chinesa, uma vez que está zerado o imposto de importação destes carros no Brasil. Neste sentido a Anfavea, através de seu presidente, se manifestou: “Pode ser de forma gradual, ou por cotas, mas é preciso haver uma regra que incentive e dê previsibilidade à produção local de veículos elétricos”, disse Marcio de Lima Leite, destacando que podemos ter em breve a mesma situação dos países vizinhos, com mais de 20% de importações chinesas sem a contrapartida da geração local de empregos. Ele ainda concluiu que a entidade quer buscar a isonomia de tratamento tributário, caso contrário não haverá cenário para investimentos maiores neste campo.

Entendemos que a entrada no mercado com força de competitividade só vai ocorrer após algumas variáveis acontecerem, como a questão dos preços dos veículos que não são nada populares. O outro problema diz respeito ao carregamento das baterias ou ampliando a questão: a infraestrutura de reabastecimento desses veículos. Vários lançamentos de condomínios têm anunciado entre as vantagens, a instalação de pontos de recarregamento de carros elétricos. Mas ainda há muitas dúvidas no ar. “Vou comprar um carro elétrico e não tenho garantia de pontos de carregamento” ou “Se eu fizer uma viagem, onde vou parar para recarregar minha bateria elétrica” Se houver respostas, não há divulgação suficiente. 

O Brasil passou por situação semelhante de troca de combustível quando foram lançados os veículos a álcool em 1979. Apesar de já existir o Proálcool, criado em 1975, houve uma grande crise de desabastecimento do etanol entre os anos de 1986 até meados de 1995 que fez com que as vendas de carros a álcool que já haviam alcançado a cifra de 700 mil unidades anuais, caíssem para somente 50 mil unidades.

Somente em 2003, com o lançamento do carro “Flex” que roda com qualquer tipo de combustível, gasolina ou álcool, ou até com a mistura dos dois é que a situação foi regularizada. Atualmente os carros Flex representam mais de 90% da frota brasileira de veículos.

Existem algumas exigências que podem forçar este crescimento de mercado. O Acordo de Paris, em que o Brasil é um dos signatários, assinado em 2015, prevê que temos uma meta de redução de emissão de gases do efeito estufa em até 37%, em relação aos níveis de emissão de 2005, até 2025. Essa meta aumenta para uma redução de 50% na emissão até 2030.

No final de 2022, foram contabilizados em todo o mundo cerca de 27 milhões de veículos elétricos representando pouco mais de 2% da frota total. Segundo o que aponta a última pesquisa anual Electric Vehicle Outlook da Bloomberg NEF a frota de veículos elétricos de passageiros no mundo, vai disparar nos próximos anos e chegar a 100 milhões de unidades até 2026 e mais de 700 milhões até 2040.

No Brasil atualmente, a frota de veículos elétricos é de cerca de 150 mil veículos

Conforme levantamento da Consultoria McKinsey, até o ano de 2035 os carros elétricos representarão 100% das vendas na Europa, 90% na China, 71% nos Estados Unidos e 70% globalmente.

E quais são as projeções para o futuro?

No último mês de julho a montadora chinesa BYD, anunciou a construção de três unidades industriais em Camaçari na Bahia, para a produção de veículos leves, utilitários e caminhões movidos a energia elétrica. Os investimentos são de R$ 3 bilhões e a empresa deve ocupar as instalações da antiga fábrica da Ford naquele estado. Os últimos ajustes estão sendo feitos e a promessa é de que no 2º semestre de 2024 sejam lançadas as primeiras unidades fabricadas aqui.

Deverão ser produzidos 7 modelos de carros elétricos ou híbridos, peças e componentes com capacidade para produção de 150 mil veículos por ano.

No final do ano passado a Agência de Notícias do Estado divulgou que a chinesa Higer Bus, que no Brasil é representada pela TEVX Motors Group vai investir US$ 50 milhões (cerca de R$ 260 milhões) em uma fábrica de ônibus elétricos localizada na região de Pecém, nos arredores de Fortaleza no Ceará. A montadora já investiu US$ 10 milhões (cerca de R$ 50 milhões) no desenvolvimento de um veículo destinado ao mercado brasileiro. Este veículo já foi homologado e agora a empresa tem planos para oferecer ônibus a hidrogênio montados em território nacional. “A Higer viu a oportunidade de entrar nesse negócio, principalmente com o projeto de eletrificação dos ônibus de São Paulo”, afirma o diretor geral para América do Sul, Marcelo Barella. Segundo a nota há um compromisso de a Prefeitura paulistana comprar 2,6 mil ônibus elétricos até 2024. Também a cidade de São José dos Campos (SP) tem planos de ter uma frota de ao menos 400 ônibus urbanos. Há ainda cidades como Curitiba, Niterói (RJ), Recife e Salvador que já iniciaram planos de eletromobilidade, visando trocar integralmente a sua frota de veículos movidos a combustíveis fósseis.

Além dessas duas chinesas, recentemente a Mercedes Benz noticiou que fabricou o seu ônibus elétrico nº 1.000 no Brasil e mais recentemente a Volvo distribuiu nota de que na cidade de Curitiba existem ônibus de sua marca totalmente elétricos circulando na capital do Paraná.

Mas como se dará esta transição energética nos veículos?

No Brasil temos uma experiência recente com um programa chamado Proinfa – Programa de Incentivo a Fontes Alternativas cujo objetivo foi o de aumentar a participação de fontes renováveis de energia elétrica, com uso de energia solar, eólica e térmicas utilizando biomassa como produtores de energia. Para este ano de 2023 foram reservados R$ 600 milhões em incentivos no programa. Na área de veículos, neste momento, temos a isenção de imposto de importação para veiculos elétricos vindos de fora, (o que é contestado pelas montadoras locais). É de se esperar que as autoridades busquem alternativas junto com a iniciativa privada para definir meios e incentivos visando superar esta fase.

Em vários países da União Europeia, na América do Norte especialmente nos EUA e na Ásia o desenvolvimento dos carros elétricos vem sendo subsidiada pelos governos através de incentivos e programas específicos.