Turbinado pela multiplicidade de benefícios oferecidos aos usuários, mercado de carros elétricos avança no Brasil.
Marcus Frediani
Em entrevista exclusiva à revista Siderurgia Brasil, Ricardo Bastos, presidente da Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE), fala sobre esses resultados, faz uma análise sobre as vantagens do setor, e alinha as suas projeções de crescimento para o futuro. Confira!

Siderurgia Brasil: Ricardo, como se comportou o mercado de carros elétricos em 2024?
Ricardo Bastos: Terminamos o ano passado batendo um novo recorde: foram 177.358 veículos eletrificados leves emplacados de janeiro a dezembro, ou 89% acima dos 93.927 de 2023. Só em dezembro, as vendas chegaram a 21.634 unidades. Esses números, porém, incluem os 3.828 micro-híbridos recém-lançados no mercado no último trimestre, com bateria de apenas 12 Volts, e sem tração elétrica, sobre os quais há uma polêmica técnica que podem ser considerados veículos eletrificados. Ainda assim, o total de 2024 superou todas as previsões da ABVE, com 173.530 emplacamentos (+85% sobre 2023), e dezembro bateu um novo recorde mensal desde o início da série histórica, com 18.942 unidades vendidas. E esse crescimento continuou em janeiro de 2025, quando foram comercializados 12.556 veículos leves eletrificados.
E a tendência continua de crescimento?
Em 2025, a tendência da eletromobilidade no Brasil é de continuidade de crescimento. Porém, em relação às vendas de veículos leves, este ano devemos experimentar um crescimento um pouco mais moderado em relação ao ano passado, pois cada vez mais as vendas têm crescido, fazendo com que o porcentual de vendas seja ajustado a cada ano. Já em relação ao segmento de ônibus, o ano de 2025 terá avanços significativos na cidade de São Paulo, principalmente no que tange ao aumento na frota de ônibus 100% elétricos. E isso, certamente, influenciará os resultados do Brasil como um todo. Também teremos um ótimo ano para veículos de entrega como vans e pequenos caminhões, nesse caso, todos 100% elétricos.
Em que medida a percepção dos benefícios da utilização de carros elétricos tem impulsionado esse crescimento?
Isso deriva exata e efetivamente da multiplicidade dos benefícios que os veículos elétricos oferecem aos seus usuários. Podemos começar falando daqueles para a saúde pública, uma vez que eles não emitem poluentes tóxicos como óxidos de nitrogênio e partículas finas, que são associados a doenças respiratórias e cardiovasculares, principalmente no âmbito das populações mais vulneráveis, como idosos e crianças, o que deixa claro que a transição para a matriz veicular elétrica também pode evitar custos bilionários com tratamentos de saúde pública causados pela péssima qualidade do ar. Associado a isso também, é importante lembrar que carros elétricos são essenciais para reduzir as emissões de CO₂ e mitigar a crise climática. No Brasil, onde cerca de 90% da energia elétrica é proveniente de fontes renováveis, como hidrelétricas e solar, que geram zero carbono, os benefícios ambientais dos VEs são ainda mais significativos, o que deixa a transição para eles bastante interessante e promissora.
Em contrapartida, porém, os preços dos VEs continuam proibitivos para grande parte da população brasileira, não é?
Bem, é aí que entram as vantagens tecnológicas. Embora o investimento inicial em um veículo elétrico ainda seja mais alto, o custo por quilômetro rodado é até sete vezes menor do que em um carro a combustão. Além disso, os gastos com manutenção são cerca de 60% menores, devido à menor complexidade mecânica. E esses fatores tornam os VEs uma opção vantajosa no longo prazo.
Mas sabemos que tão importante quanto a tecnologia embarcada desses veículos, fator predominante, é também a infraestrutura para atendimento dos usuários, no que tange, por exemplo, à rede elétrica de abastecimento. Isso vem avançando também?
Sim, e em ritmo contínuo e acelerado. Aliás, o destaque mais importante para 2025 é que este será o “Ano da Infraestrutura” para o setor, uma vez que teremos importantes projetos já sendo anunciados em São Paulo, Rio de Janeiro e em outras regiões, como o Nordeste. Segundo dados da ABVE, atualizados em novembro de 2024, o Brasil conta com mais de 12 mil eletropostos públicos e semipúblicos, sendo que esse número vem crescendo rapidamente. Enquanto isso, soluções como carregadores rápidos e ultrarrápidos estão ganhando cada vez mais espaço, e tornando o processo de recarga dos veículos cada vez mais ágil e prático, reduzindo a preocupação com a autonomia em viagens mais longas, lembrando que a autonomia média de um carro eletrificado é de cerca de 300 quilômetros.
Apesar de aparentemente não ser contrária à utilização dos veículos elétricos no Brasil, a ANFAVEA tem defendido o aumento de impostos sobre carros elétricos importados, por acreditar, segundo consta, que o crescimento das importações pode prejudicar a produção local e a neoindustrialização do país em vários sentidos. Como vocês avaliam essa questão?
A ABVE é contrária a esse pedido, que prevê o aumento imediato do imposto para 35%, o que está previsto pelo Governo Federal para ocorrer somente em julho de 2026 para modelos 100% elétricos e híbridos em geral. Consideramos que esse aumento antecipado causaria sérios prejuízos tanto ao mercado brasileiro de eletromobilidade quanto ao avanço das políticas ambientais e de inovação tecnológica no país. O pedido de reconsideração da aplicação dessa medida pela ANFAVEA prejudica as empresas que já investiram ou têm planos de investir em um horizonte próximo no país, principalmente no desenvolvimento de uma indústria brasileira de veículos elétricos. Vale destacar ainda que a medida impactará negativamente vários aspectos da eletromobilidade no Brasil, restringindo o acesso da população aos veículos eletrificados, e comprometendo planos de produção e localização de investimentos já estabelecidos, em consequência da inevitável insegurança jurídica decorrente de uma súbita mudança das regras do jogo que foi definida ainda no final de 2023 pelo próprio Governo Federal.