Especialistas se debruçam sobre o trabalho de fazer previsões do novo cenário global no pós-COVID. E, pode acreditar: as mudanças serão profundas e para lá de surpreendentes.
Marcus Frediani
Cientistas e dados da Universidade de Tecnologia e Design de Singapura utilizaram Inteligência Artificial para criar previsões baseadas em dados das trajetórias da COVID-19 em diferentes países, prevendo, finalmente, quando o surto atual terminará. O relatório pressupõe que uma vacina provavelmente será encontrada e administrada a granel no terceiro trimestre de 2021. Assim, com o fim da pandemia global, já previsto para dezembro de 2020, surgirá uma nova maneira de viver. E o mundo, com toda a certeza, será muito diferente.
Tendo em vista antecipar algumas mudanças que moldarão essa nova realidade, a Allianz Partners, líder global em assistência de mobilidade e seguros, produziu, em parceria com o renomado futurologista Ray Hammond, o relatório “Life after COVID-19”, traduzindo, “A Vida depois da COVID-19”. E as credenciais do profissional estão longe de ser as de um “leitor de bola de cristal”: premiado, em 2010, com a “Medalha de Ouro das Nações Unidas em Serviços para Futurologia”, Hammond tem enorme e comprovada experiência escrevendo e falando sobre as tendências que moldarão o que está por vir. Por exemplo, seu longo histórico de previsões precisas é único na Europa, continente que vive agora, no presente, o futuro que ele descreveu há quase 40 anos.
Organizado em categorias pontuadas em tópicos que fazem parte da vida rotineira de qualquer habitante do planeta Terra, independentemente da profissão, classe social ou lugar do mundo em que essa pessoa more – tais como “Casa”, “Mobilidade Pessoal” e “Viagens” –, com impactos sensíveis também na vida empresarial e, por tabela, no futuro dos negócios.
Assim, por exemplo, no mundo pós-COVID, as residências das pessoas não deverão ser mais um lugar para passar apenas noites e finais de semana: elas se tornarão verdadeiras ‘fortalezas digitais multifuncional’. Enquanto isso, as viagens rodoviárias deverão voltar aos níveis normais, com as principais cidades do mundo continuando a se reorganizar a infraestrutura para estimular o uso da micromobilidade. Já no que tange às viagens, medidas rigorosas de saneamento serão adotadas em todo o setor, tanto no âmbito do lazer e turismo quanto naquele dos deslocamentos de pessoas ao trabalho.
“Embora o trabalho em casa tenha sido uma exceção antes da pandemia, ela se tornará cada vez mais normal para os empregos que o permitirem. Como consequência disso, muitos que passaram a trabalhar em casa por conta do isolamento social e do lockdownestão agora se perguntando se faz sentido ter um carro na garagem. É provável que isso acelere a tendência de aluguel de carros no curto prazo, e não a ‘posse’ deles, o que, provavelmente, também vai aumentar o número de pessoas que utilizarão o modelo de compartilhamento de veículos”, pontua Hammond.
Outra tendência muito clara apontada pelo relatório “Life after COVID-19” é a que prevê que a experiência de viagens, incluindo as de negócios, nunca mais será a mesma. “Estas últimas deverão ser reconsideradas, pois a pandemia mostrou que o gerenciamento global de projetos pode ser feito por videoconferência, permitindo reduções de custos financeiros e de emissões de Gases de Efeito Estufa. Provavelmente, apenas reuniões comerciais, exposições e eventos esportivos internacionais voltarão aos níveis normais no futuro próximo”, antecipa o futurologista.
O MUNDO PEDE (MAIS!) INOVAÇÃO
Apesar da esperança e, mais concretamente, do viés de retomada da economia brasileira que já se anuncia, as cicatrizes de todas as dificuldades e incertezas pelas quais passamos nos últimos meses, infelizmente, vendo muitas empresas e negócios ruírem ou entrarem em colapso de uma hora para a outra durante a pandemia. E isso, é claro, além de sequelas de ordem financeira, também causou danos emocionais significativos nos empresários, executivos e trabalhadores dos mais diversos segmentos da indústria.
Nesses casos, é notório o quanto é difícil dissociar a emoção da razão, motivo pelo qual vem ganhando força entre as organizações a tendência de contratação de profissionais e consultorias pontuais, que possam orientar as empresas sobre a melhor forma de elas se reorganizarem, indicando-lhes, inclusive, novas opções de projetos. “O auxílio de um profissional capacitado poderá aliviar, inclusive, a carga na seleção de pessoas por exemplo, que representem os interesses da empresa no mercado”, destaca Conceiyção Montserrat, CEO da Montserrat Consultoria, empresa especializada em gestão e desenvolvimento de negócios.
Outra dica importante da consultora no momento da retoma é selecionar com critérios os fornecedores para melhorar os custos de produção, dentro da proposta de melhoria de resultados a partir da equação de custo/benefício. “Neste momento, o mote é ‘ser flexível’ para ressignificar a empresa, o negócio e a prestação de serviços agregados. O mundo pede inovação, novidades… Então, é necessário renovar, seja na forma de venda, seja na oferta dos produtos e, ainda, no tratamento dispensado aos clientes, o que vai determinar, também, que eles vejam a imagem da organização com bons olhos”, aconselha Montserrat.
LIDERANÇAS (MAIS!) HUMANAS
A pandemia do novo coronavírus exigiu que empresas, lideranças e colaboradores adotassem novos hábitos, rotinas e mudassem o jeito de se relacionar, o que deve representar um legado permanente, além de positivo, para o mundo corporativo. “O momento requer adaptação, criatividade, ousadia e resiliência. E as empresas que se negarem a rever seus processos estarão fadadas ao fracasso.” A opinião é do CEO e headhunter David Braga, da Prime Talent, empresa de busca e seleção de executivos de média e alta gestão, que atua em todos os setores da economia na América Latina.
A antevisão do executivo deriva da constatação de que, em função do isolamento social ocasionado pela COVID-19, as relações de trabalho, em praticamente todos os segmentos, sofreram profundas transformações, tornando ainda mais evidente para as organizações a importância do papel do novo líder nesse contexto, com uma postura mais humana, compreensiva, próxima e atenta às necessidades de cada colaborador. “A tecnologia é suporte para a entrega dos resultados, mas é por meio das pessoas que os resultados são obtidos. De nada adianta aplicar a robotização, os aplicativos e os e-commerces se as pessoas não se olharem nos olhos. Especialmente no cenário de crise e do pós-crise, a humanização se torna ainda mais imprescindível para o desenvolvimento da equipe e conquista de resultados”, observa Braga.
Segundo o CEO da Prime Talent, outra questão que merece atenção especial neste momento são os efeitos que as transformações aceleradas pela pandemia promoverão nos colaboradores, como a necessidade de serem vistos como protagonistas. “Saímos de uma cultura de poder e controle, quando era possível monitorar o funcionário de 8h00 às 18h00, e passamos para uma cultura de performance, ou seja, de mais empoderamento do colaborador, com base na confiança”, sublinha, deixando claro que para superar os desafios que já estão chegando é necessária uma mudança de mindset dos líderes, com mais foco em performance do que em controle de horas trabalhadas.
Nesse cenário, na antevisão que Braga faz do mundo pós-pandemia, as empresas mais estratégicas irão adotar após a pandemia o modelo híbrido, por meio do qual será possível o colaborador trabalhar não apenas home office, mas também na empresa ou mesmo em coworkings. “Se falamos tanto em futuro do trabalho, o presente se configura a partir das novas modalidades de contratação, de trabalho e de colaboradores que se tornam mais exigentes não só no que diz respeito ao equilíbrio entre o lado ‘profissional’ e o lado ‘pessoal’, como também com a entrega de resultados pensando em legado e com vistas a um capitalismo consciente”, finaliza ele, deixando o alerta.