Em face à inevitável Transformação Digital da economia global só os fortes e conectados irão sobreviver.
Marcus Frediani
A aceleração da Transformação Digital representa um desafio fundamental para as infraestruturas de missão crítica como os Data Centers e os Edge Computing. O próximo ano será voltado para a velocidade, a escalabilidade e a complexidade, tanto no que diz respeito ao seu core e tamanho quanto em suas bases periféricas. Nessa toada, será imprescindível e urgente, entre muitas outras coisas, implantar novos sites em tempo recorde, implementar e utilizar ferramentas para o gerenciamento e o monitoramento remotos e online dos processos, bem como administrar e despachar os técnicos de forma remota. E tudo isso, é claro, vai aumentar consideravelmente a complexidade da gestão da infraestrutura.
Tarefa difícil e absolutamente obrigatória, mas não impossível cumprir, como relata Fernando García, vice-presidente e gerente geral para a América Latina da Vertiv, empresa-líder global em soluções de infraestrutura crítica para Data Centers, redes de comunicação, ambientes e redes industriais. Confira isso e muito mais nesta entrevista exclusiva que ele concedeu à revista Siderurgia Brasil diretamente de seu escritório em Miami-Flórida/EUA.
Siderurgia Brasil: Fernando, qual a previsão que você faz do mundo pós-pandemia”? E qual será o papel da tecnologia no chamado “Novo Normal”?
Fernando García: A crise de saúde que estamos enfrentando mudou tudo ao nosso redor, causando um impacto social e econômico que terá consequências difíceis de prever. Sem dúvida, esse é o momento de enfrentarmos essas mudanças e nos prepararmos para o trabalho que vem pela frente. E essa crise não apenas confirma que a forma como usamos a tecnologia mudará para sempre, mas, também, que a transformação digital da economia se dará a um ritmo acelerado, gerando uma sociedade hiperconectada.
Como essa aceleração se manifesta em termos globais, principalmente no que diz respeito à Transformação Digital?
Bem, a COVID-19 acelerou o ritmo da Transformação Digital de uma forma que também ninguém podia prever. Mas, é bom que fique claro, não foi a pandemia em si que fez isso, mas, sim, o fato de precisarmos ficar confinados e manter distanciamento social, o que forçou todas as empresas no planeta a adotar tecnologias e políticas de home office. Isso, em conjunto com as tecnologias de colaboração, permitiu a várias empresas continuar trabalhando e até mesmo prosperar nesse ambiente. As operadoras de telecomunicações e as provedoras de serviços de internet precisaram, de um dia para o outro, se adaptar a picos de demanda e investir em reforçar e fortalecer as redes. De repente, atividades rotineiras – como treinamentos, telemarketing e consultas médicas, entre outras – precisaram ser realizadas em um ambiente virtual. Tanto que, hoje, não resta a menor dúvida que a maioria dessas tecnologias estão aqui para ficar, e terão um papel de destaque na forma como nos comunicaremos e trabalharemos de maneira colaborativa no futuro. A razão para isso é que todos nós aprendemos que podemos realizar muita coisa sem viajar ou gastar horas no trânsito e que, assim, podemos alcançar um equilíbrio muito melhor entre trabalho e família.
OK! Mas, na prática, quais serão as principais tendências que deverão se cristalizar globalmente nessa nova fase?
Analiso o novo cenário a partir do que vem sendo chamado de “5Ds”, que são os cinco vetores transformacionais: 1) a descentralização da população; 2) a distribuição de conteúdo; 3) o deslocamento do trabalho, da educação e da saúde; 3) a deslocalização da cadeia de suprimentos; e 5) a necessidade de descarbonizar a economia. A crise atual está fazendo com que cada um deles se desenvolva em frente aos nossos olhos, em tempo real, e todos contribuíram e continuarão a contribuir para a digitalização da economia. O principal gatilho foi, logicamente, a necessidade de manter o distanciamento social, forçando a maioria das rotinas diárias a se deslocarem. Isso, por sua vez, levou governos e cidades a se ajustarem a uma população mais descentralizada, fazendo que, em razão da crise, os governos assumissem e acelerassem a implementação de serviços digitais, como, por exemplo, o e-government e os serviços públicos digitais. E a necessidade de conferir maior capacidade em seus portais, está fazendo com que diversos deles estejam trabalhando na aprovação da ampliação do espectro radioelétrico, o que, por sua vez, favorece a aceleração da implementação das redes 5G. Acerca disso, vale lembrar que parte do conceito de “Cidade Inteligente” é manter os cidadãos em segurança. E podemos aproveitar algumas tecnologias inteligentes para ajudar com o distanciamento social, tais como as câmeras de vigilância urbana com os Circuitos Fechados de Televisão (sigla do inglês das “Closed-Circuit Televisions” – CCTVs) e as de reconhecimento facial, as medidas de geolocalização para rastrear veículos e telefones, as entregas em domicílio utilizando robôs e drones, e, ainda, o desenvolvimento de inúmeros serviços sem pilotos, ou autônomos. E, com as pessoas ficando em casa, naturalmente também está sendo acelerada a distribuição de conteúdo para entretenimento, jogos e concertos musicais ao redor do planeta, como, aliás, todo mundo já anda vendo por aí.
E, nesse cenário, o crescimento do Armazenamento em Nuvem, o Cloud Computing, também deverá crescer exponencialmente, correto?
Sem a menor dúvida. E isso, por motivos óbvios: provisão flexível dos recursos de Tecnologia de Informação (TI), implementação mais rápida, maior segurança e até menores custos. Ao mesmo tempo, a pandemia está acelerando também a adoção do Edge Computing, a chamada “Computação em Borda”, um paradigma aproxima a computação e o armazenamento de dados do local onde eles são necessários, na medida em que cada vez mais recursos são necessários próximos aos pontos de uso, a fim de melhorar os tempos de resposta e economizar largura de banda. Esse modelo é essencial para aplicações sensíveis à latência, não só nas já citadas “Cidades inteligentes”, como também no “Varejo Inteligente, por exemplo.
E no ambiente da Indústria, como tudo isso já está se manifestando e vai se manifestar ainda mais no futuro?
O distanciamento social imposto pela COVID-19 teve um impacto profundo em fábricas, cadeias de suprimentos e manufaturas. A necessidade de garantir contato pessoal limitado está acelerando a taxa de adoção da automação e de Inteligência Artificial (IA). São tecnologias que estão substituindo a necessidade de ter pessoas em pé na frente de máquinas ou de esteiras transportadoras. Isso terá um impacto de longa duração na criação de empregos, com vários trabalhos manuais sendo substituídos por IA e automação de máquinas. Por conta disso também, começamos a ver em todo o mundo como as fábricas digitalmente avançadas (as chamadas Smart Factories, ou Fábricas Inteligentes) estão adotando a automação de processos para reduzir o número de pessoas que trabalham na fábrica.
Nessa história toda, como fica a questão da Inteligência Digital de Gestão de Fornecedores?
Será uma extensão natural da Transformação Digital. Em crise global como a que estamos passando, tornou-se muito claro que nossa cadeia de suprimentos não pode depender apenas de uma fonte de produtos no leste da Ásia, nem depender de um ou dois fornecedores. E isso fez com que, do dia para noite, várias empresas percebessem o quanto suas cadeias de suprimentos são vulneráveis, o que as forçou a repensar como querem comprar produtos e serviços no futuro para aproveitar os benefícios de contar com diversas alternativas de fornecedores de peças e serviços, em vez de depender de uma só fonte para isso. Novas tecnologias – como a impressão em 3D, para realizar uma diferenciação ou customização tardia do produto, ou fabricar praticamente qualquer coisa – estão se tornando mais relevantes para permitir a “deslocalização” da cadeia de suprimentos e garantir a diferenciação desta, aproximando-a dos clientes.
Bem, fazer tudo isso, em curto ou curtíssimo tempo, parece uma tarefa longe de ser fácil e, sobretudo, repleta de desafios. Então, por onde começar?
Verdade. Implantar e gerenciar uma infraestrutura de Tecnologia da Informação (TI) híbrida e complexa não é uma tarefa fácil. Mas, na minha modesta opinião, o principal desafio é o cultural. E a primeira coisa a entender é que a Transformação Digital não é uma tarefa do departamento de TI das empresas: ela precisa ser um movimento estratégico, que inclua toda a organização. Hoje, vejo que muitas delas estão usando uma miríade de ferramentas e aplicações espalhadas pelas diferentes arquiteturas – On-premises, Cloud, Colocation, Edge etc. –, mas é muito mais do que isso. Nesse processo, os departamentos de TI têm que abandonar as funções de “suporte”, e passar a exercer funções de “produção”, transformando-se em Marketing, Recursos, Manufatura e por aí vai. Então, trata-se de mudar seu modelo de negócio para usar a tecnologia como um impulsionador. E isso é muito diferente da visão tradicional de “investir” em mais hardware e mais software para ser mais eficiente. Estamos falando de mudar sua cadeia de valor usando a tecnologia como um facilitador. Garantir a disponibilidade e a segurança de todos esses dados e aplicações requer um gerenciamento de infraestrutura abrangente. E a melhor forma de realizá-lo é primeiramente reconhecer a complexidade desse novo contexto, determinar os recursos necessários e investir pesadamente em treinamento e educação em todas as áreas da empresa. Assim, para finalizar, é até triste dizer, mas, em um futuro próximo, as empresas que não buscarem uma estratégia agressiva e eficiente de Transformação Digital dentro desses moldes não irão sobreviver por muito tempo.