O mercado de energias renováveis passa por um momento de vertiginoso crescimento no país. Bom para as empresas, bom para a economia, e bom para todos os brasileiros.

Marcus Frediani

No dia 13 de outubro, um fato promete marcar de forma bastante expressiva o futuro do mercado de energia em terras verde e amarelas. Nessa data, a Engie Brasil Energia – maior geradora privada do setor no país, com sede em Florianópolis/SC, e controlada pelo grupo franco-belga Engie – vai realizar um leilão eletrônico para compra de energia de longo prazo, a ser entregue no submercado Sudeste/Centro-Oeste, mas que pode ser oriunda de qualquer região do Brasil, destinada ao suprimento do Ambiente de Contratação Livre (ACL). O leilão é destinado a empresas que possuam projetos de geração em desenvolvimento, implantação ou operação, e prevê a compra de energia elétrica incentivada 50%, originária de projetos de energia solar e/ou eólica, a ser fornecida durante o período de 2023 a 2037.

Esse fato alinha-se a inúmeras outras iniciativas no sentido de ampliar o uso e a participação das fontes renováveis na matriz energética nacional, tendência que, na realidade, já se configura como irreversível. Em tempo: as fontes de energia renováveis são aquelas que possuem um ciclo de renovação em escala de tempo humana, ou seja, estão sempre disponíveis para utilização e não se esgotam, sendo a principal delas a energia solar proveniente da luz do sol, além das fontes eólica, da biomassa, a hídrica, a maremotriz (a energia das marés) e a geotérmica, obtida a partir do calor proveniente do interior da Terra, todas aplaudidas de maneira efusiva pelos ambientalistas, uma vez que são limpas e altamente sustentáveis. Isso sem falar nos menores custos de geração e entrega em relação às matrizes convencionais, que embora às vezes possam ser altos no ato da instalação, têm prazos de retorno bastante atrativos para os investidores.

O SOL REIVINDICA MAIS ESPAÇO

E os números dessa progressão não mentem. Por exemplo, segundo levantamento realizado em agosto último pela Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (ABSOLAR), o Brasil acaba de ultrapassar a marca de 3 Gigawatts (GW) de potência operacional da fonte solar fotovoltaica em usinas de grande porte. No total, a fonte já trouxe mais de R$ 15,9 bilhões em novos investimentos privados no País apenas nesta modalidade, tendo gerado cerca de 90 mil empregos acumulados. A arrecadação para os cofres públicos no período totaliza R$ 5,2 bilhões.

Com esses resultados para lá de animadores, o Brasil assumiu a 16ª posição no ranking mundial da fonte solar fotovoltaica – liderado pela China, seguida do Japão, Estados Unidos e Alemanha –, ingressando no chamado “TOP 20” dos países com mais capacidade instalada em operação, somando as grandes usinas centralizadas e os pequenos sistemas distribuídos em residências, comércios, indústrias, propriedades rurais e no setor público.

No segmento de geração centralizada solar fotovoltaica, o Brasil possui o equivalente a 1,7% da potência instalada da matriz elétrica do País. Os investimentos totais previstos até 2025 referentes aos projetos já contratados em leilões de energia ultrapassam R$ 25,8 bilhões. Em 2019, a fonte foi a mais competitiva entre as renováveis nos dois Leilões de Energia Nova, A-4 e A-6, com preços-médios abaixo dos US$ 21,00/ por Megawatt/hora (MWh). Atualmente, as usinas solares de grande porte são a sétima maior fonte de geração do Brasil, com 101 empreendimentos outorgados e em operação em nove estados brasileiros, nas regiões Nordeste (Piauí, Ceará, Bahia, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Paraíba), Sudeste (Minas Gerais e São Paulo) e Norte (Tocantins).

POTENCIAL DE LIDERANÇA MUNDIAL

Para o presidente-executivo da ABSOLAR, Rodrigo Sauaia, o Brasil é uma nação solar por natureza, com condições privilegiadas para se tornar uma liderança mundial na área. “A energia solar fotovoltaica reduz o custo de energia elétrica da população, aumenta a competitividade das empresas e desafoga o orçamento do poder público, beneficiando pequenos, médios e grandes consumidores do País. E, sem a menor dúvida, ela terá função cada vez mais estratégica para o atingimento das metas de desenvolvimento econômico do país, sobretudo agora, no período pós-pandemia, já que se trata da fonte renovável que mais gera empregos no mundo”, destaca o executivo.

De acordo com o banco de dados da Agência Nacional de Energia (ANEEL), o número de instalações unidades geradoras fotovoltaicas triplicou em 2019 e, em 2020, apesar dos impactos causados pela pandemia, o mercado solar brasileiro segue em crescimento e com excelentes perspectivas. Segundo a agência, foram registradas mais de 74 mil novas instalações no primeiro semestre de 2020, somando uma potência de 898 Megawatts (MW). Isso representa um aumento de 70% da capacidade instalada na comparação com o mesmo período do ano passado, enquanto o número de sistemas cresceu mais de 75%.

“Com um cenário favorável no Brasil, estima-se que a tecnologia fotovoltaica mantenha a curva de crescimento em 2020 e seja um dos pilares da retomada econômica do país, assim como aconteceu nas crises econômicas de 2015 e 2016. Inclusive, de acordo com um novo relatório da Agência Internacional de Energia Renovável (IRENA), o investimento em fontes de energias renováveis poderia levar à expansão do PIB mundial em cerca de US$ 100 trilhões até 2050 e auxiliar na retomada da economia”, sublinha José Renato Colaferro, cofundador e diretor de Operações da Blue Sol Energia Solar, empresa com ampla atuação na oferta de soluções para energia solar no segmento de Geração Distribuída.

FONTE INESGOTÁVEL DE CALOR

Tais argumentações também encontram eco entre os representantes da Associação Brasileira de Energia Solar Térmica (ABRASOL), que destacam que a preocupação com a sustentabilidade também deverá influenciar definitivamente a escolha pelo sistema de aquecimento solar térmico. “Lamentamos profundamente as perdas irreparáveis com a pandemia do novo coronavírus. Contudo, acreditamos que todo esse sofrimento passado pelas pessoas e pelas empresas, incluindo, claro, as indústrias, está servindo para elas entenderem que é fundamental buscar uma maneira de viver com menos, pensando mais na proteção ao meio ambiente”, destaca Oscar de Mattos, presidente da ABRASOL.

“Nos últimos anos, nosso setor tem trabalhado duramente para fortalecer junto aos governos a ideia de que é preciso mudar a fonte de energia. Precisamos apostar em energia limpa, em inovação, de forma a eficientizar e baratear o custo de infraestrutura desses sistemas. Investir na energia solar térmica é garantir uma energia renovável, e fortalecer a indústria nacional, assegurando empregos e inserindo o Brasil em um grupo seleto que pensa e age em prol da proteção do meio ambiente. E veja bem, não se trata de inventar nada: nosso país tem tecnologia, equipamentos de primeira linha e um fator natural invejável”, complementa o executivo.

DOMANDO A FORÇA DOS VENTOS

Porém, segundo o balanço de junho de 2020 da Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEEólica) e ANEEL, quem chega arrasando é a energia eólica já é a segunda maior fonte da matriz energética brasileira, com 9,3% de participação, ficando atrás apenas da hidrelétrica (59,6%), e à frente da biomassa (8,7%), do gás natural (8,6%), do petróleo (5,2%), das Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) e das Centrais Geradoras Hidrelétricas (CGHs) (3,5%), do carvão (2,1%), da fotovoltaica (1,7%) e da nuclear (1,2%). Complementarmente, ainda de acordo com a ABEEólica, a capacidade instalada no país chegou à marca de 16 GW no primeiro semestre de 2020. São 637 parques eólicos e 7.738 aerogeradores. Em 2019, a indústria eólica investiu R$ 13,6 bilhões no Brasil, dados da Bloomberg New Energy Finance (BNEF). A infraestrutura gerou 55,9 Terawatts/hora (TWh) de energia, 15% a mais em relação a 2018.

Produzida a partir das massas de ar em movimento – ou seja, o vento –, ela é aproveitada por meio da conversão da energia cinética de translação em energia cinética de rotação, e tem múltiplas vantagens de utilização. No âmbito socioeconômico e ambiental, os benefícios da energia eólica vêm, obviamente, do fato de ela ser renovável e causar baixo impacto nos locais da sua instalação e operação. Como parques eólicos não emitem CO2, somente em 2019, foram evitadas as emissões de 22,85 milhões de toneladas de gás carbônico, montante que, segundo a ABEEólica, equivale à emissão anual de cerca de 21,7 milhões de automóveis. Além disso, gera renda e melhoria de vida para proprietários de terra com o pagamento de arrendamentos, que são tributados, para colocação das mais de 7 mil torres em operação.

Já do ponto de vista técnico, tais parques possuem fator de capacidade (dado que mede a produtividade dos ventos) acima da média mundial. “Em 2019, o fator de capacidade médio mundial foi de 34%; no Brasil foi de 42,7%. Durante a ‘safra dos ventos’, período de junho até o final do ano, houve mês com média de 59%. Com cada vez mais parques eólicos operando, em 2020, o Brasil chegou à 7ª posição no Ranking Mundial do Global Wind Energy Council (GWEC). A estimativa do setor é de que o país terá cerca de 24,2 GW de capacidade instalada até 2024, considerando leilões já realizados e contratos firmados no mercado livre”, pontua Elbia Gannoum, presidente executiva da ABEEólica. “Complementarmente, vale ainda salientar que, conforme o Boletim Anual de Geração Eólica de 2019, que considera fatores como a representatividade e o abastecimento, a geração por fonte eólica foi responsável por 9,71% (atingindo 14,17% no pico da safra dos ventos, em agosto daquele ano) na média de toda a geração injetada no Sistema Interligado Nacional (SIN), acrescenta ela.

PIONEIRISMO NA BAHIA

E atestando o vetor de crescimento e representatividade das fontes eólicas na matriz energética brasileira, diversas iniciativas vêm ganhando corpo ao longo do país, em especial em sua Região Nordeste, que é responsável pela geração de 88,88% do montante eólico do Brasil, produzido por meio de 7.738 aerogeradores atualmente em operação no país.

Exemplo disso vem dos municípios de Tucano, Araci e Biritinga, todos localizados na Mesorregião do Nordeste Baiano – este último, no conhecido Território de Identidade do Sisal – que vão ganhar o primeiro complexo eólico daquela parte do estado. A estimativa é que a AES Tietê, empresa de geração de energia elétrica pertencente ao grupo AES Brasil, invista R$ 1,3 bilhão na primeira fase de construção dos parques, que terão capacidade instalada de 322 MW. Estima-se que todas as etapas da obra gerem até 500 empregos, aproveitando em parte a mão de obra local. Além do pioneirismo na região, neles serão instaladas as maiores turbinas do país em potência e tamanho. O Governo do Estado, por meio da Secretaria de Desenvolvimento Econômico (SDE), tem apoiado institucionalmente a implantação do empreendimento.

“A Bahia já se consolidou como a terra dos bons ventos. Saber que passaremos a produzir energia a partir da fonte eólica num lugar que, até então jamais poderíamos imaginar que seria possível, é uma grata surpresa. Teremos novos municípios beneficiados pela força das energias renováveis. A SDE desempenha um papel de articulador com objetivo de melhorar os processos autorizativos que impactam no prazo e até na viabilidade dos empreendimentos eólicos”, afirma João Leão, vice-governador e secretário da pasta.

CASA DOS VENTOS

Outro exemplo emblemático vem do Rio Grande do Norte, campeão nacional na geração de energia eólica, atualmente dono 165 parques com capacidade instalada de 4.526,4 MW, segundo os números da ABEEólica: o empreendimento Casa dos Ventos, a ser instalado no Seridó potiguar, mais precisamente no município de Caiçara do Rio do Vento, que já está em ritmo acelerado de construção. “Já concluímos todo o levantamento topográfico, toda a parte de sondagem, terraplanagem, aberturas de acesso e vias, e estamos em estágio avançado em outras etapas como escavações das áreas de montagens dos aerogeradores e início das armações e ferragens”, detalha José Felício Zanetti, gerente de Implantação, da Casa dos Ventos. “Estamos trabalhando arduamente para acelerar o ritmo da obra e atingir nossa meta, que prevê a entrega do empreendimento para o segundo semestre de 2021” complementa ele.

Após sua entrada em operação comercial, o parque terá 504 MW de potência, distribuídos em 120 aerogeradores que serão instalados nos municípios de Bento Fernandes, Caiçara do Rio do Vento, Riachuelo e Ruy Barbosa. A Linha de Transmissão que irá escoar a energia gerada em Rio do Vento também está em fase avançada de supressão vegetal, escavações e fundações de torres. Outras etapas que já estão em andamento são a pré-montagem de estruturas metálicas no solo e concretagem das bases. A linha de transmissão é de 500 Kilovolts (KV), e levará a energia gerada da subestação localizada no município de Riachuelo, através dos municípios de Riachuelo, Santa Maria, Ielmo Marinho e Ceará-Mirim, para ser conectada à subestação da Chesf neste último município (Ceará-Mirim). “E a região já começa a sentir os impactos positivos da implantação do empreendimento, por meio da geração de empregos e a abertura de estabelecimentos comerciais, tais como restaurantes, padarias e pousadas, serviços de entrega e outros”, finaliza Zanetti.