Dando continuidade à dinâmica observada desde o início de 2021, a atividade da indústria de transformação cresce no Brasil. Nesse cenário, maior acesso à tecnologia e atitude inovadora continuam sendo prioridades. Mas é preciso manter os pés no chão.

Marcus Frediani

Boas notícias. Aliás, excelentes. A pesquisa Índice GS1 Brasil de Atividade Industrial recentemente divulgada pela Associação Brasileira de Automação-GS1 Brasil demonstrou que a indústria de transformação apresentou crescimento de 8% na comparação com o mês anterior no dado livre de efeitos sazonais. Comparado a abril de 2020, o índice apresentou aumento de 33,5% e, no acumulado de 12 meses, o crescimento de 8,9%.

A dinâmica de sucessivos resultados positivos é uma tendência que vem sendo observada desde o começo deste ano. “O crescimento no indicativo ao longo dos cinco primeiros meses de 2021 confirma a recuperação com relação ao ano passado. Somado a ele, a intenção de lançamentos de produtos nesse mesmo ritmo mostra a confiança da indústria brasileira em uma retomada da economia para 2021”, analisa Virginia Vaamonde, CEO da GS1 Brasil.

A confiança para fazer lançamentos, como se sabe, é como um coelho assustado. Coloca o focinho para fora da toca, mas, ao menor ruído estranho no bosque, corre para dentro de novo. E esse é um movimento muito volátil e constante de vai-e-volta. Mas alguns setores, segundo Virginia, vêm apresentando graus de resiliência exemplares, como é o caso do de alimentos, bebidas e mesmo o têxtil, que passou por alguns apuros em 2020.

De certa forma, a dinâmica da pesquisa da GS1 parece “rimar” com as perspectivas de retomada econômica do Brasil em um futuro próximo. Contudo, o país não deve passar ileso às velhas questões de rebote. Por exemplo, no último dia de maio, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) projetou que, em ritmo de restauração, o PIB brasileiro deverá crescer 3,7% em 2021 e 2,5% em 2022, impulsionado pela recuperação do consumo das famílias e da volta dos investimentos. Porém, em compasso de dar uma martelada no prego e outra na ferradura, em relatório sobre perspectivas econômicas, a mesma OCDE prevê o “preço” a pagar por essa evolução: a inflação ao consumidor avançará a 6,2% este ano, antes de desacelerar a 4% no próximo.

PÉS NO CHÃO
Então, como afirma a CEO da GS1, a alternativa mais segura para o empresariado é “ficar com um olho no peixe e outro no gato”. Em outras palavras, pés no chão e cautela continuam sendo as principais recomendações profiláticas. “Para grande parte dos empresários – principalmente os micro e pequenos, que compõem 80% do quadro associativo da GS1 –, o capital de giro é coisa para 28, 30 dias. Então, é muito difícil achar o ponto de equilíbrio nessa história. E o papel da GS1, enquanto entidade, é exatamente o de fornecer conhecimento, ferramentas e conteúdos sob a forma de cursos, palestras e outras atividade para que nossos associados transitem com mais desenvoltura e mais rapidamente para encontrá-lo”, explica Virginia.

Nesse cenário, a tecnologia desempenha grande influência para promover mais acertos do que erros. E é por isso que mesmo em tempos de pandemia, a busca por inovação, mais do que palavras bonitas, representa conceito e prioridade recorrentes na indústria. E a boa notícia é que os empresários não só estão cientes disso, como também estão se mexendo para acelerar o investimento em automação para aprimorar seus processos.

“Os padrões GS1, que são globais e têm como item mais conhecido o código de barras de identificação de produtos, são apontados como muito importantes para automatizar os processos de venda de produtos, compras e gestão empresarial. 71% das empresas pesquisadas usam o código de barras como identificador em todo seu portfólio de produtos”, pontua a CEO da associação.

Os resultados do estudo foram compilados em dezembro do ano passado, a partir da análise de tendências nos setores de saúde, que contempla indústria farmacêutica e de insumos médicos; no de alimentos, que envolve alimentos processados, bebidas, panificação, frutas, legumes e verduras; e na indústria em geral considerando cosméticos, higiene, beleza, química, têxtil, calçados e mercado pet. No levantamento, cerca de 95% das empresas afirmaram que pretendem investir ao menos um pouco em inovação e tecnologia em 2021, o que, efetivamente, vêm acontecendo. Foi possível identificar também que a pandemia acelerou os investimentos em canais de vendas digitais para 46% das empresas consultadas.

AUTOMAÇÃO DE PROCESSOS
Entre os benefícios logísticos dos códigos de barras, a “praia” da GS1, estão custo baixo de implantação, uso amplamente difundido no mercado nacional e internacional, gerenciamento de estoque, melhorias no abastecimento, gestão da produção e precisão na leitura. Por vantagens como essas, 83% dos produtos em circulação no país têm o código de barras como padrão para identificá-los nos sistemas automatizados.

A automação dos processos logísticos depende fundamentalmente de um cadastro preciso de todos os itens produzidos pela indústria para garantir também a gestão do fluxo de documentação em todas as áreas envolvidas, por exemplo, em distribuição, faturamento, controle de estoque, reposição em gôndolas, checkout do varejo e muito mais.

Nesse âmbito, o cadastro de produtos tem no código de barras um aliado para evitar inconsistências em processos que causam prejuízos à cadeia de abastecimento como atrasos em entregas, compras e carregamentos emergenciais, divergências entre pedido e nota fiscal, inconsistência no controle de inventário e recusa do varejo por inconsistências entre os dados da nota e pedido. Esses itens foram mencionados por pelo menos 37% das empresas participantes da pesquisa.

APETITE POR INOVAÇÃO
E esse avanço de nível tecnológico e o boom dessa procura por atualização para competir mais e melhor, que tem como exemplo emblemático o aumento da demanda por novas plataformas de vendas tende a continuar. Mas a intensidade e o tipo de resposta em termos de digitalização depende muito do estágio em que uma empresa ou indústria se encontra. Por exemplo, para uma MEI, digitalizar foi colocar vendas pelo WhatsApp. Já para uma siderúrgica no limiar da implantação das ferramentas da Indústria 4.0 – ou que já esteja definitivamente integrada a ela –, a dimensão dessa resposta naturalmente tem contornos muito diferentes. Então, tudo é muito relativo.

“Entretanto, de forma geral, o que temos visto, já há algum tempo, é que existe, de fato, um crescimento na adoção de novas tecnologias, mesmo nos anos em que o Brasil passa por dificuldades. E isso nos mais diversos setores e segmentos, como o varejo, o atacado, o e-commerce, o setor de serviços e dentro da indústria de bens de consumo duráveis, semiduráveis e não duráveis, em empresas de pequeno, médio e grande porte, dos quatro cantos do Brasil”, destaca Carolina Fernandes, economista com especialização em pesquisa de mercado, que atua na área de Pesquisa e Desenvolvimento da GS1 Brasil, responsável pela pesquisa do Índice de Automação do Mercado Brasileiro. “Todas as regiões brasileiras apresentaram crescimento consistente nos últimos anos de acompanhamento do índice, como comprova a quinta edição da pesquisa, que acabamos de realizar”, complementa.

Mas, claro, continuar mantendo os pés no chão continua sendo imperativo. “Ainda estamos vivendo um momento difícil com a pandemia, o que tem dificultado um avanço mais consistente das empresas no cenário da inovação disruptiva, que implica mais riscos. Eu diria que, nesse momento, há muitas empresas que poderiam apostar mais em inovação, mas não o fazem por conta exatamente desses riscos. E, falando sinceramente, há muitas delas hoje em dia que estão mais preocupadas em sobreviver do que em investir em condutas disruptivas. Porém, acredito que os brasileiros têm, sim, um apetite por inovação. Assim, creio que quando esse momento difícil passar, temos tudo para acelerar e deslanchar com mais velocidade nesse campo também”, finaliza Virginia Vaamonde.