Com força e cada vez mais robustez, siderúrgicas batem recordes no Brasil e injetam grandes aportes de recursos para o aperfeiçoamento de seus modelos de negócios.

Marcus Frediani

Recordes operacionais, previsões de investimentos, ESG em alta. Apesar das atribulações vivenciadas no ano passado a indústria siderúrgica brasileira, como se diz no popular “dá seus pulos” e demonstra vigor surpreendente. Ao contrário das previsões dos pessimistas de plantão, 2021 se revelou um ano bastante positivo para a siderurgia nacional. É o que mostram os balanços que começam a ser divulgados pelas empresas do setor, gerando comemorações não só entre os investidores como também entre as instituições que as representam e os analistas do mercado.

É o caso, por exemplo, do recente anúncio feito pela gigante do aço Usiminas, dando conta dos resultados do consolidado do ano, que registraram um Ebitda Ajustado anual de R$ 12,8 bilhões, resultado cerca de 300% superior ao contabilizado no ano anterior (2020) e um recorde histórico para a Usiminas. Descontados os efeitos não recorrentes, o Ebitda foi de R$ 10,7 bilhões no ano, também um recorde histórico. Já a margem Ebitda Ajustado de 2021 ficou em 38%, contra 20% de 2020.

No consolidado de 2021, a companhia registrou lucro líquido de R$ 10,1 bilhões, outro recorde histórico. Esse número é 679% superior ao lucro líquido apresentado em 2020, de R$ 1,3 bi, e reflete o forte desempenho operacional de todas as unidades de negócio da empresa. Ainda no que se refere ao consolidado, em função da forte geração de Ebitda, a Usiminas encerrou 2021 com o Caixa e Equivalente de Caixa em R$ 7 bilhões, resultado 44% superior à posição registrada em 2020 (R$ 4,9 bi).

O ano de 2021 se destacou também nas vendas de aço da empresa, que atingiram 4,8 milhões de toneladas, o maior volume registrado desde 2013 e alta de cerca de 30% quando comparado com 2020. Algo em torno de 90% do volume de vendas da empresa foram direcionados ao mercado interno e o restante às exportações. Já a Mineração Usiminas contabilizou um volume de vendas de minério de ferro de 9 milhões de toneladas, recorde anual. Em 2020, o volume de vendas atingiu 8,7 milhões de toneladas.

Sérgio Leite

“Encerramos 2021 com os melhores resultados da história da companhia. Mesmo com os impactos da pandemia da COVID-19, que ainda persistem no país e no mundo, a equipe Usiminas, mais uma vez, respondeu com agilidade e competência aos desafios do ano. Para além dos resultados financeiros e operacionais, tivemos um período de grandes e relevantes entregas, com destaque para as iniciativas da nossa agenda ESG”, avalia Sergio Leite, presidente da companhia. Exemplo disso foi o início das operações do sistema de filtragem e empilhamento a seco inaugurado na Mineração Usiminas, em dezembro do ano passado, a partir de uma injeção de recursos da ordem de R$ 235 milhões, permitindo à empresa pôr fim ao ciclo do uso de barragens convencionais para disposição de rejeitos.

Paralelamente, a siderúrgica também anunciou investimentos de R$ 2,05 bilhões no exercício, valor que deve ser referência também para o próximo ano, em função da reforma do Alto-forno 3 da usina de Ipatinga, no Vale do Aço, prevista para o segundo trimestre de 2023. As despesas de capital estimadas para a reforma são de R$ 650 milhões, sendo que deve haver paralisação de 100 dias até a conclusão. “Os R$ 2 bilhões são 33% a mais que no ano passado (R$ 1,5 bilhão). O montante será dividido entre as cinco unidades de negócios, mas a maior parte – R$ 1,64 bilhão – será para a siderurgia, R$ 350 milhões para a mineração e R$ 50 milhões para a Soluções Usiminas”, informa Leite.

Ainda que bastante ciente de que no Brasil, devido a inúmeras circunstâncias, o cenário de 2022 continua desafiador e será diferente daquele de 2021, o executivo, entretanto, contém a euforia e é cauteloso ao falar sobre as expectativas quanto a este ano. Mas, mantendo o otimismo, a aposta que faz e de mais crescimento. “Em 2022, nosso desafio será exatamente manter um bom resultado diante dessas circunstâncias. Acreditamos que embora ainda em patamares abaixo do esperado, a economia brasileira deve continuar crescendo, assim como a siderurgia nacional, cuja expectativa, conforme dados divulgados pelo Instituto Aço Brasil, é de que a produção brasileira de aço bruto tenha um crescimento de cerca de 2% neste ano. Assim, a Usiminas prevê volume de vendas de minério de ferro entre 8,5 e 9 milhões de toneladas em 2022 e de 1,1 a 1,2 milhão de toneladas de aço no mesmo período”, projeta, deixando claro, no entanto, que alguns ajustes, obviamente, serão necessários para a companhia voltar a ter um desempenho positivo nos próximos meses. E nessa pauta, naturalmente, estará sua política de preços: depois de reajustar cerca de 20% dos contratos do setor automotivo em torno de 60% a 70%, e a distribuição entre 5% e 10%, a Usiminas deverá concluir a negociação com as demais montadoras de veículos em abril, nos mesmos moldes do que foi feito em janeiro.

PERFORMANCE MÁXIMA
Quem também está comemorando resultados recordes de produção de aços de alta tecnologia (HST) em 2021 é a Companhia Siderúrgica do Pecém (CSP), com sede em São Gonçalo do Amarante, no Ceará. O balanço do ano passado aponta que eles representaram 24,4% da produção de 2,8 milhões de toneladas da usina no ano, sendo que, em novembro, a linha de produtos premium da empresa chegou a 42% de participação, batendo um recorde mensal.

Os aços de alta tecnologia se diferenciam das placas de aço comerciais pelo fato de se destinarem a aplicações que requerem maior variedade de elementos químicos na composição e por exigirem extrema limpidez. As tubulações para a passagem de petróleo ou gás, por exemplo, demandam aços com 16 elementos químicos. Para torres eólicas, motores, equipamentos de linha amarela (maquinários pesados) e construção de pontes, a resistência mecânica abrasiva é essencial. Para o contato com o petróleo, o aço deve estar apto a ambientes corrosivos e de temperaturas agressivas. Em automóveis, esses aços HTS são aplicados a peças de segurança, estruturais e na barra de direção, entre outras. Para a composição externa do veículo, o aço deve ter conformação mecânica, possibilitando curvas e atendimentos mais complexos dos requisitos do design.

No âmbito das boas novidades de 2021, outro resultado inédito e notável no âmbito das ações em prol da ESG, a famosa e bem apreciada política de desenvolvimento calcada na Governança Ambiental, Social e Corporativa, que tantos avanços têm gerado no ganho de imagem das empresas do setor junto à sua clientela. Uma das que ganhou mais destaque no ano que passou foi o salto positivo que a CSP deu na classificação internacional de qualidade Seis Sigma, escala que certifica fornecedores quando estes promovem perdas em clientes abaixo de 3,4 ppm (partes por milhão). Em 2021, a empresa teve performance de eficiência superior a 99,9%, reduzindo o índice de sucata/downgrade de seus clientes na produção de aço para 1,5 ppm.

Alex Nascimento

“Desde 2018, a CSP já era um fornecedor típico de classe mundial, e fechamos 2021 com a performance máxima de Seis Sigma, elevando-a ao patamar de atendimento da indústria aeronáutica, que é a que exige muito mais qualidade do aço e os menores índices de falha possíveis. E essa conquista obtida na oferta de nossos aços premium desempenhou importante papel na melhoria das margens e na rentabilidade do nosso mix de vendas. Assim, de uma só tacada, conseguimos alinhar não só o aumento significativo no percentual de aços de alta tecnologia de nossa companhia a um superlativo índice de qualidade de produtos”, comemora Alex Nascimento, gerente geral de Metalurgia e Qualidade da CSP.

Para estar habilitada a atender o mercado de HTS, a CSP renovou ainda importantes certificações em 2021, como a certificação ISO 14.001:2015 – relacionada ao meio ambiente –, a IATF 16.949, que a habilita a fornecer aço para o setor automotivo, e, ainda, a ISO 9001, que confirma o sistema de gestão de qualidade da empresa, estabelecendo diretrizes para a produção do aço, com o objetivo de tornar a siderúrgica do Pecém uma referência mundial em não só em qualidade, como também em segurança, custo e desenvolvimento tecnológico e sustentável. E, além dessas, a siderúrgica cearense mantém outras dez certificações.

“Todo esse investimento reforça ainda mais a proposta da CSP no sentido de ampliar continuamente nossa participação no mercado nacional e internacional de aços de alta resistência, não só para atender às indústrias do petróleo, química, automotiva de luxo, como também àquelas de maquinários pesados, de torres eólicas e obras de infraestrutura”, enfatiza Nascimento.

CONFIANÇA NO BRASIL
No dia 11 de novembro do ano passado, a ArcelorMittal divulgou investimentos da ordem de R$ 4,3 bilhões no Brasil para ampliar a capacidade de suas operações no país mais concretamente a partir de 2024. Conforme informado pela empresa na ocasião, do total aprovado, R$ 1,9 bilhão serão gastos em sua mina de Serro Azul, em Itatiaiaçu/MG, onde construirá uma unidade de pellet feed para praticamente triplicar sua produção das atuais 1,6 milhão de toneladas para 4,5 milhões de toneladas/ano de minério de ferro super fino. Já os outros R$ 2,7 bilhões serão investidos na conclusão de uma nova linha de produção na usina de João Monlevade, a 115 quilômetros da capital mineira, com a construção de uma unidade de sinterização, um alto-forno e uma aciaria, a fim quase dobrar a capacidade produtiva, que deverá passar das 1,2 milhão de toneladas de aço bruto para 2,2 milhões de toneladas/ano em 2024.

E agora, no dia 10 de fevereiro – portanto há quase exatos três meses do anúncio anterior –, a gigante mundial do aço voltou à carga, e acaba de comunicar um novo aporte bilionário, desta vez na unidade de Barra Mansa, no estado do Rio de Janeiro. O investimento de R$ 1,3 bilhão, concentrado nos próximos três anos, será direcionado à expansão da produção da aciaria e da laminação daquela planta industrial, visando à sua modernização e à ampliação do portfólio de produtos e soluções voltados prioritariamente ao mercado interno dos setores automotivo, de energia e de construção civil.

Na verdade, o novo anúncio não chegou a surpreender ninguém, até porque, notoriamente, os negócios da ArcelorMittal no Brasil seguem de vento em popa por aqui. No início de fevereiro também, o balanço da empresa informou um lucro líquido de US$ 4,05 bilhões no 4º Trimestre de 2021, um valor quase quatro vezes maior do que o ganho de US$ 1,21 bilhão apurado por ela no 4T20. Em igual período, as vendas da empresa subiram de US$ 14,18 bilhões nos três últimos meses de 2020 para US$ 20,81 bilhões entre outubro e dezembro, superando de longe a previsão de analistas fornecida pela própria empresa, que era de US$ 4,95 bilhões.

Jefferson de Paula

De acordo com Jefferson De Paula, presidente da ArcelorMittal Brasil e CEO ArcelorMittal Aços Longos LATAM e Mineração Brasil, o novo anúncio reforça a confiança da empresa na recuperação econômica e no desenvolvimento do país. “O investimento acompanha o crescimento de mercado e amplia ainda mais o nosso portfólio. Nossa meta é oferecer um leque cada vez maior de produtos de alta qualidade. O fato de sermos líderes não nos acomoda. Ao contrário: nos faz estar sempre em busca da antecipação das necessidades dos nossos clientes”, faz questão de enfatizar.

Ainda segundo De Paula, o anúncio do novo investimento ocorre ainda em meio à comemoração dos 100 anos de atuação da empresa no segmento de Aços Longos no Brasil, e reflete a sua aposta na construção do próximo século de sua história. “Da mesma forma, fortalece a posição de destaque da empresa no portfólio de produtos do Grupo ArcelorMittal, e como benchmark em termos de segurança, qualidade, rentabilidade, inovação e sustentabilidade. Tivemos resultados extraordinários de 2021, e ainda que eles não sejam mantidos, a empresa acredita no crescimento significativo da demanda por aço, especialmente nos setores-chave da economia brasileira, como construção civil, automotivo, máquinas e equipamentos, e por minério de ferro”, conclui o CEO.

VISÃO DE FUTURO
Embora os dados do 4º Trimestre de 2021 ainda não tenham sido oficialmente divulgados, os números consolidados do 3T21 da Gerdau – os únicos disponíveis até o momento – são para lá de eloquentes, e apontam que a produção de aço bruto pela companhia revela significativo aumento ante igual período de 2020. Segundo eles, a siderúrgica apresentou lucro de R$ 5,58 bilhões no período, o que representa alta de 610% em relação aos R$ 785,5 milhões apurados no mesmo período de 2020. Já a receita avançou 74,4% de julho a setembro de 2021 e alcançou R$ 21,32 bilhões, enquanto o faturamento da companhia chegou a R$ 12,22 bilhões em igual intervalo de 2020.

Gustavo Werneck

A conquista de cifras como essas, naturalmente, provocou uma série de manifestações positivas da parte dos analistas do mercado financeiro. Os resultados de terceiro trimestre da Gerdau foram muito fortes, com o Ebitda de R$ 7 bilhões representando alta de 228% na comparação anual e algo em torno de 14% acima do que a maioria dos bancos estimava, que elogiaram ainda o anúncio da nova distribuição dos dividendos, que já somavam mais de R$ 5 bilhões no 3º Trimestre de 2021, o que já representava um retorno de 12% sobre a cotação do início do ano passado, turbinando a expectativa de potenciais dividendos sobre os lucros ainda elevados em 2022.

Assim, a sensação geral deixada entre esses especialistas é de que a conquista de resultados financeiros recordes em 2021 – ano em que completou 120 anos de história – é de que a Gerdau deu início a um novo ciclo de crescimento. E isso ficou ainda mais claro quando, ainda no final do ano passado, participando de uma reunião da Associação dos Profissionais de Investimentos de Mercado de Capitais (Apimec), Gustavo Werneck, Harley Scardoelli e Marcos Faraco – respectivamente, o CEO, o CFO e o vice-presidente da Gerdau –, falaram sobre visão de futuro e trouxeram as expectativas da empresa para 2022 nos mercados em que está presente.

Na ocasião, Scardoelli apresentou os resultados do 3T21, dando conta de que a Gerdau encerrou o período com um fluxo de caixa livre positivo de R$ 3,8 bilhões, maior valor gerado na série histórica. “O fluxo de caixa corrobora nosso comprometimento com a remuneração adequada do capital investido, somado ao compromisso da companhia com sua posição de liquidez”, afirmou. “Complementarmente, investimos ao longo de 2021 cerca de R$ 1,8 bilhão. A previsão de desembolso de CAPEX para o ano segue estimada em R$ 3,5 bilhões, valor que inclui investimentos em modernização e ampliação da capacidade nas operações de negócios no Brasil, na América do Norte e em aços especiais”, acrescentou.

Por sua vez, Faraco destacou o ano positivo até aquele momento, com capacidade de produção em torno de 80% no Brasil. Segundo ele, o dado se devia ao bom desempenho de alguns setores, como a construção civil, que aumentou em 40% sua demanda em 2021 no país, e segue com tendência positiva para 2022. O executivo também destacou a retomada da infraestrutura em 2021, além do setor industrial, com destaque para a agricultura (máquinas, tratores, colhedeiras), máquinas amarelas (crescimento de quase 50% em 2021) e energia. “Já são mais de 20 parques eólicos com produtos Gerdau em 2021, com tendência de crescimento”, pontuou executivo. Com a demanda em alta, Marcos Faraco ainda informou que a estratégia da Gerdau inclui crescimento, com investimentos nas usinas de Ouro Branco/MG, Caucaia/CE e Araucária/PR, e em perfis estruturais; sustentabilidade, com o aumento da base florestal para produção de carvão vegetal utilizado na produção; investimento em Indústria 4.0; e valor agregado, com a expansão dos portfólios e capilaridade proporcionada pelas unidades da Comercial Gerdau.

Reforçando esse discurso, Werneck fez questão de afirmou que o mercado de aços especiais segue promissor no Brasil, tanto pela demanda por veículos pesados quanto pelo segmento de energia eólica, que alcançou 20 gigawatts de capacidade instalada no país. “Estamos investindo mais de R$ 2,3 bilhões para a modernização e ampliação das nossas operações de aços especiais em um período de cinco anos. E parte desse valor será destinada à unidade de Pindamonhangaba/SP, onde iniciaremos a operação de um novo lingotamento contínuo em agosto de 2022, o que resultará em um processo mais automatizado e com melhor rendimento”, concluiu no encontro da Apimec, destacando ainda a retomada da produção de fio-máquina na planta da companhia em Charqueadas, no Rio Grande do Sul para abastecer o mercado de fixadores.

Firme em seu propósito de avançar de forma acelerada em dois grandes desafios – gerar mais valor para os clientes e se tornar ainda mais sustentável –, no dia 1º de fevereiro a Gerdau anunciou que assumiu o compromisso de reduzir suas emissões de gases de efeito estufa dos escopos 1 e 2 de seu inventário, para um valor inferior a 50% da média global da indústria do aço. Para fazer isso, ela ampliará o uso de sucata ferrosa como matéria-prima para a produção de aço, expandirá sua área florestal, responsável pela produção do carvão vegetal –, que funciona como biorredutor na fabricação do ferro-gusa – e aumentará o uso de energia renovável, como os parques solares já anunciados no Brasil e nos Estados Unidos. Simultaneamente, a empresa também investirá em iniciativas de maior eficiência energética e operacional de suas unidades, em novas tecnologias e inovação aberta. “Ao atingirmos a meta proposta para 2031, daremos um passo importante para a nossa ambição de ser carbono neutro em 2050, mesmo sabendo que a neutralidade na indústria do aço ainda não é algo viável na atualidade. Mas queremos ser parte dessa solução”, afirma Gustavo Werneck, deixando o recado e incentivando mais siderúrgicas a fazerem o mesmo.