O setor passa por um momento de muita reflexão, pois todos os indicadores deixam dúvidas quanto ao seu futuro.
Henrique Patria
O resumo do comportamento do setor no ano de 2023, apresentado pelo Instituto Aço Brasil é uma amostra muito realista de que o setor passa por uma dura prova que se não for solucionada a tempo poderá causar prejuízos irrecuperáveis para o Brasil.
A siderurgia é um segmento essencial na vida de uma nação e no caso brasileiro uma das principais bases da industrialização de nosso país. Sua importância começou a ser escrita em abril de 1941 com a criação da Companhia Siderurgica Nacional – CSN em Volta Redonda – RJ.
Neste momento, as últimas palavras do presidente do Instituto Aço Brasil na reunião de apresentação dos números do setor foram de que se não forem tomadas medidas políticas a tempo, já no primeiro trimestre do ano de 2024, as usinas terão de iniciar o processo de desativação de equipamentos, com consequências imprevisíveis para a indústria nacional.
Todo este furor está acontecendo porque de um lado temos gráficos, relatórios e demonstrativos provando de que o Brasil não apresenta nenhum movimento no sentido da recuperação de sua capacidade de investimento ou crescimento econômico fazendo com que os mesmos 108,6 quilos por habitante de 2022 devem se repetir agora em 2023.
O consumo percapita brasileiro que em 1980 era de 100,8 quilos por habitante, cresceu nestes 43 anos somente 8%, enquanto no mundo o crescimento foi de 74,2% e em países que se desenvolveram realmente como a China este número chega ao absurdo de 1.918%.
Este é um dos problemas do setor que só vai mudar quando realmente tivermos em andamento um plano real de desenvolvimento, com investimentos em áreas como habitação, saneamento, infraestrutura, transportes etc., mas o outro problema e mais imediato é regular a entrada de aço importado, principalmente vindo da China, com preços claramente aviltados em relação a realidade de custos.
Segundo Jefferson de Paula, presidente do Conselho do Aço Brasil “Não há de nossa parte nenhuma razão para acreditarmos no otimismo do governo em relação ao crescimento de nossa economia”.
Visando conter esta investida da China todos os países mundiais tomaram medidas para salvaguardar a sua indústria. Há países que consideram a indústria siderúrgica como assunto de segurança nacional.
No caso do Brasil, ele vem sendo atacado pela onda de importação de aço, principalmente da China, sem que as autoridades tomem qualquer posição em defesa da indústria nacional.
Entre janeiro e outubro de 2022 o Brasil recebeu um total de 2.686 milhões de toneladas e já neste ano chegamos a um total de 4.157 milhões com crescimento de 54,8%. Na previsão do Aço Brasil este ano deveremos atingir a 5 milhões de toneladas e no ano que vem a 6 milhões de toneladas de importados.
As consequências são imprevisíveis para a indústria nacional, sendo a mais grave a desativação de postos de trabalho em toda cadeia siderúrgica. Hoje existem perto de 200 mil empregos diretos e cerca de 3 milhões de empregos indiretos em toda a cadeia. Além disso a perda de arrecadação e as consequências sociais são imensuráveis, uma vez que todas as usinas participam muito diretamente em todas as comunidades em que estão localizadas suas unidades.
Ainda, segundo Jefferson De Paula, o Brasil tem um consumo médio estimado de aproximadamente 22 milhões de toneladas e neste ano as importações irão passar dos 3 milhões do ano passado, para próximo dos 5 milhões, ou seja, algo perto de 25% de todo o consumo nacional.
Há uma deterioração acentuada do setor pois se no período de janeiro a abril de 2022 as vendas internas foram de 6.622 mil toneladas, já entre neste ano de 2023 foram de 6.422 mil toneladas com queda de 3.6%. Neste mesmo período as importações subiram de 1.062 mil em 2022 contra 1.259 mil em 2023 já com crescimento de 18,5%. Mas a crise tomou contornos dramáticos no período de abril a outubro, uma vez que em 2022 foram vendidas no mercado interno 12.395 mil contra 11.548 mil toneladas em 2023, já com uma queda de 6,8% e no mesmo período as importações saltaram de 1.796 mil toneladas para 2.669 mil toneladas em 2023 com crescimento portanto de 48,6%.
Há uma questão muito relevante a ser levada em consideração. As usinas haviam programado investimentos na ordem de R$ 52,5 bilhões entre 2022 e 2026, principalmente nos processos de descarbonização do aço, que são a grande pegada e exigência mundial neste momento.
Evidentemente todo este planejamento está comprometido e não há como imaginar-se uma companhia mundial realizando investimentos deste montante com o quadro atual de mercado.
A grande gestão que o setor está fazendo junto as autoridades é que se crie uma taxa de importação emergencial de 25% – hoje de 9,6% – a exemplo do que fazem todos os países do mundo. É uma medida emergencial já que todas as nações do mundo adotaram esta postura para conter o avanço chines e a indústria brasileira, por não ter esta salvaguarda é a grande prejudicada no contexto mundial.
A realidade é que a China tem um excedente de 191 milhões de toneladas de produção. Está se prevendo que ela deve fechar as exportações de 100 milhões de toneladas só neste ano. Só para conferir este número excedente é duas vezes a capacidade instalada da siderurgia brasileira e 3 vezes a média da produção real dos últimos cinco anos do Brasil. A China produz atualmente em 11 dias toda a produção brasileira, incluindo todas as usinas aqui instaladas. Mas a importação na verdade é uma pratica lícita de mercado. O problema são os excessos e os preços irreais que estão sendo praticados. A indústria siderúrgica chinesa é na sua maioria estatal, recebendo incentivos na sua composição de custos e fazendo que com que o excedente tenha de ser exportado a qualquer preço, chegando aqui com preços aviltados. Segundo Carlos Loureiro, presidente do Inda “Está sendo praticado no caso do aço um “dumping explicito” pois ao se considerar o preço no mercado internacional do minério de ferro e do carvão, claramente fica demonstrado que não é possível colocar o aço aqui no Brasil com os preços que estão chegando”.
Mas há alguns entraves nesta situação internacional pois o Brasil tem a China como a maior compradora em vários produtos, principalmente produtos agrícolas o que deve dificultar uma negociação neste momento.
Do outro lado, existem os consumidores de aço que por sua vez fazem a sua pressão no sentido de que não seja colocada nenhuma barreira fiscal, uma vez que eles estão sendo beneficiados com esta situação.
Quanto aos números atuais a situação mostra o acumulado até outubro com produção de 26.610 mil toneladas contra 28.953 mil do ano passado – queda de 8,1%-, Vendas Internas 16.394 mil deste ano contra 17.306 mil do ano passado com queda de 5,3%, as exportações de 9.936 mil contra 10.188 do ano passado, as importações foram de 4.157 mil contra 2.686 mil em 2022, ou seja, crescimento de 54,8% e o Consumo Aparente que demonstraria o crescimento, conforme foi citado no início desta nota ficou em 19.998 mil contra 19.940mil, portanto estável, sem movimento.
Henrique Patria: Editor Chefe Portal e revista Siderurgia Brasil